Os
trabalhadores do Millennium BCP não têm de aceitar o roubo de salários e
direitos que a administração do banco acordou com as organizações da UGT,
alertou anteontem o Sintaf/CGTP-IN, contestando vivamente um «ajuste salarial
temporário» que, afinal, não evita a liquidação de mais de um milhar de postos
de trabalho.
Bancos
salvos com dinheiro público devem ser nacionalizados
http://www.avante.pt/pt/2094/emfoco/128657/
O
Sindicato dos Trabalhadores da Actividade Financeira rejeita o acordo que a
Febase/UGT firmou, no último dia de 2013, com a administração do Millennium
BCP, e vai promover a oposição individual e colectiva à aplicação das graves
medidas nele inscritas.
Num
comunicado que está a distribuir desde anteontem, o Sintaf alerta os
trabalhadores do banco para o facto de que podem recusar tais medidas e impedir
que lhes sejam aplicadas, mesmo que venham a ser introduzidas nas convenções
colectivas assinadas pelas organizações da UGT. Para tal, cada trabalhador
deverá declarar à administração, por escrito, que se opõe à aplicação dessas
normas, nos termos legais (Código do Trabalho, artigo 104, n.º 2), no prazo
máximo de 21 dias, «a contar do início da execução do contrato ou da divulgação
do regulamento».
O Sintaf adianta já que vai disponibilizar a minuta de um texto, com esse
objectivo, que os trabalhadores poderão subscrever e enviar.
Mas
é destacada a importância da organização e mobilização dos bancários do BCP.
Com o objectivo de «esclarecer, organizar e dinamizar a resistência contra este
atentado aos salários e direitos dos trabalhadores», o Sintaf anunciou, para os
próximos dias, reuniões de trabalhadores e reformados do Millennium BCP:
–
dia 22, quarta-feira, em Lisboa, às 18 horas, na sede da CGTP-IN (Rua Vítor
Cordon, 1);
– dia 23, quinta-feira, no Porto, às 18 horas, na Casa Sindical da USP/CGTP-IN
(Rua Padre António Vieira, 195);
– dia 28, terça-feira, em Lisboa, às 18 horas, na sede do Sintaf (Av. Almirante
Reis, 74G, 7.º).
Acordo
para perder
O
«memorando de entendimento» subscrito a 31 de Dezembro foi divulgado como a
troca de postos de trabalho por cortes salariais. A redução de pessoal e dos
respectivos custos é um compromisso que o BCP assumiu com a direcção-geral de
Concorrência (DGComp) da União Europeia e com o Estado português, quando foi
aprovada a injecção pública de três mil milhões de euros para a recapitalização
do banco. Em Setembro, o banco anunciara que iria reduzir 1244 trabalhadores
(dos 8744 que tinha, em Junho, para 7500 que pretende ter em 2017) e encerrar
97 balcões, para obter neste quadriénio uma «redução de custos com o pessoal
superior a 30 por cento, face à média de 2008 a 2011.
A
Febase destacou que o acordo permitirá «garantir a salvaguarda de cerca de 400
postos de trabalho e a reposição das actuais condições remuneratórias, após o
reembolso pelo Millennium BCP do investimento realizado pelo Estado». No mesmo
comunicado, a federação-base da UGT explica que «a falta de um acordo com os
sindicatos colocava na mira do despedimento colectivo cerca de 1600 trabalhadores».
As contas só batem certas quando se lê mais adiante, na «explicação sindical»,
que o banco terá que reduzir para 7100 trabalhadores, se não cumprir os cortes
definidos até Dezembro de 2017.
Para
o Sintaf, mesmo sem conhecer o teor oficial completo do «memorando de
entendimento», mas avaliando a informação que as partes subscritoras tornaram
pública, sobressaem quatro consequências:
–
a redução de salários;
– a possibilidade de, futuramente, o banco proceder a despedimentos;
– o período entre 2014 e 2017 não ser considerado para contagem de
diuturnidades;
– a suspensão, durante estes quatro anos, das promoções por mérito, sem
prejuízo de a administração poder promover amigos e correligionários.
O
sindicato da CGTP-IN assinala ainda que «este processo também está a confirmar
o que afirmamos desde o seu início: colocar a questão de aceitar cortes nos
salários em troca de uma declaração de que não haverá despedimentos é, afinal,
aceitar os cortes e os despedimentos».
Reiterando as posições que assumiu, o Sintaf declara que:
–
não aceita despedimentos ou reduções de salários ou pensões e vai apoiar os
trabalhadores na luta contra tais objectivos;
– vai dinamizar todas as formas de luta (sindicais ou judiciais), que os
trabalhadores do Millennium venham a desenvolver contra os despedimentos e a
diminuição dos salários e pensões;
– o Millennium BCP e os bancos, em geral, salvos à custa do erário público,
devem ser inseridos na esfera pública, nacionalizando-os e colocando-os ao
serviço da economia nacional, e não dos interesses especulativos dos
banqueiros.
A
UGT faz o seu papel
O
Sintaf confia que «todos os trabalhadores conscientes sabem qual é o papel das
organizações da UGT: levar os trabalhadores a aceitarem, o mais pacificamente
possível, a retirada de direitos pretendida pelo patronato e os seus governos,
apresentando esse caminho como inevitável e considerando como vitória os
ligeiros recuos (em aspectos de pormenor) que o patronato tem já equacionados
aquando da elaboração das medidas que quer impor».
Num sector «onde as organizações da UGT têm o papel de direcção-geral dos
banqueiros para a actividade sindical», este caso «é particularmente
exemplificativo». As estruturas da UGT «identificam-se com o acordo
banco/Governo/UE (DGComp) e assumem como bons os argumentos de que a “salvação”
do BCP está dependente de tais medidas».
«É falso! » - protesta o Sintaf, notando que «as despesas com pessoal são
diminutas e não foi por sua causa que o banco apresentou resultados negativos e
imparidades que, no terceiro trimestre de 2013, atingiram em conjunto o
montante de 1600 milhões de euros», enquanto os custos com pessoal foram de
511,3 milhões (aqui se incluindo as milionárias pensões de altos responsáveis,
como Jardim Gonçalves).
«Mesmo que despedissem todos os trabalhadores, o BCP continuava a ter
prejuízo», como comentava José Cabrita, coordenador do Sintaf, à agência Lusa,
durante um protesto realizado a 26 de Novembro, junto ao edifício do Millennium
na Rua Augusta, em Lisboa.
O banco, o Governo e UE pretendem «utilizar a crise de sobreprodução para a
procura solvente e sobreacumulação de capital e para embaratecer a mão-de-obra,
quer directamente, com a diminuição dos salários, quer indirectamente, com os
despedimentos e a criação de um exército de reserva de desempregados».
O Sintaf sublinha que «é isto que a UGT aceita» e acrescenta que esta não
contestou também a possibilidade de recurso ao despedimento colectivo, «cujos
requisitos legais não se verificam neste caso».
Nuno Amado, presidente executivo do Millennium BCP, «congratulou-se pela
transparência, empenho e razoabilidade que sempre caracterizaram estas
negociações», escreve o banco, no comunicado que publicou dia 31 de Dezembro.
Accionistas
só recebem
«Deviam
ser os accionistas do banco a assumir integralmente a recapitalização do BCP,
já que ao longo dos anos receberam milhares de milhões de euros», defendeu o
PCP, numa nota emitida a 13 de Novembro, considerando que a recapitalização do
Millennium BCP representou «um escândalo». O Partido lembrava, então, que «só
entre 2004 e 2009 os lucros do BCP atingiram cerca de 3500 milhões de euros» e
salientava que o fundo de recapitalização da banca, «não foi criado para
proteger os clientes, mas sim os banqueiros».