TESOUROS SUBAQUÁTICOS
A notícia da provável descoberta daquilo que ainda
resta da embarcação que levou, acidentalmente, Cristóvão Colombo ao continente
americano, a Santa Maria é, do ponto
de vista arqueológico, um fenómeno maravilhoso, pois que se trata de uma
embarcação de madeira, desaparecida há mais de cinco séculos (1492), e a
respeito da qual se teceram várias lendas, mais ou menos engenhosas. Contudo,
sempre se disse que a nau se teria afundado no Mar das Caraíbas, na Ilha
Hispaniola, junto à costa norte do Haiti.
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Pelos dados históricos, e a ser verdadeiro o achado
reclamado agora pela equipa de investigadores norte-americanos chefiados por
Barry Clifford, não será expectável encontrar-se entre os escombros da Santa Maria peças arqueológicas
importantes. É que o naufrágio teve lugar num banco de areia, dando assim tempo
bastante para o resgate – feito com apoio de indígenas – de grande parte da
carga que o navio transportava, assim como dos tripulantes, passando tudo isso
para outra nau da frota de Cristóvão Colombo, a Niña. Segundo agora se sabe,
nos últimos anos, algumas das peças que restavam dentro da nau foram retiradas
por piratas.
Portanto, tudo o que, eventualmente, venha a ser
recuperado terá simples valor simbólico e histórico, mas nunca verdadeiro valor
comercial, como aconteceria se, dentro dos escombros da nau, se achassem, como
em outros casos, tesouros vendáveis. Porém, para o Haiti será sempre uma mais
valia, caso o que restar da nau possa ser exposto num museu dentro do seu
território, constituindo-se, assim, em pólo de atracção turística.
Ao longo da actividade marítima, sempre se afundaram
navios, de maior ou de menor dimensão, uns em que se notaram mais as perdas
humanas, mas outros em que o maior destaque foi dado aos valores materiais
transportados e submergidos. É, sobretudo, a busca destes últimos valores que
tem estimulado a pesquisa subaquática levada a cabo por empresas privadas
especializadas que se vêem, assim, recompensadas do seu esforço e do
investimento feito.
Muitos desses empreendimentos têm, por vezes, como
aliados, instituições de carácter científico muito interessadas na pesquisa e
na descoberta da verdade histórica. Afinal, tudo isso contribui para que se vão
desvendando espaços subaquáticos adormecidos nas profundezas dos mares,
oceanos, e até de rios, guardando segredos de dezenas, centenas ou mesmo
milhares de anos.
Ainda há pouco tempo foi noticiada a descoberto em
Arles – uma vila romana situada no sul de França – um busto do Imperador Júlio
César, esculpido em mármore. A vila foi fundada pelo Imperador romano menos de
um século antes de Cristo. Esse busto de Júlio César teria, eventualmente, sido
lançado para o rio após o seu assassínio, e constitui a mais antiga
representação do Imperador até hoje conhecida. Apresenta-o calvo e com traços
envelhecidos.
São também, frequentemente, descobertos navios
afundados durante a Segunda Guerra Mundial, muitos deles tendo no seu interior
verdadeiros tesouros, alguns dos quais transportados de um modo pirata, durante
as acções de saque a que os nazis se dedicaram um pouco por toda parte onde
passaram e que dominaram.
Pela certa, também teremos próximo das nossas costas
marítimas uma riqueza subaquática não desprezível, já porque, quer na rota
marítima para as Índias, quer de e para as Américas se terão afundado navios
com o seu bojo cheio de bens de grande valor.
Vem-me, por acaso, agora à memória uma parte da
epopeia vivida pela esquadra de Salvador Correia de Sá e Benevides, quando se
dirigiu para Angola com a intenção de expulsar o ocupante holandês. Muito
resumidamente, a história pode ser contada nos seguintes termos.
Saído do Rio de Janeiro em Maio de 1648, Salvador
Correia de Sá e Benevides rumou para Angola, num total de 12 navios e 1.200
homens. Dois meses depois, chegou ao Quicombo, no kwanza Sul, onde enfrentou
uma tempestade marítima que lhe dizimou parte da sua Armada, assim como 3
centenas de homens. O Navio Almirante da Armada, tripulado por Baltazar da
Costa de Abreu, afundou com o seu comandante.
Já se diz que o que verdadeiramente sucedeu foi um
maremoto que se transformou no que hoje comummente se denomina de Tsunami. Tal
Tsunami terá arrasdo parte dos navios do Almirante Salvador Correia de Sá e
Benevides. Mesmo assim, ele rumou para Luanda, onde propôs aos holandeses que
deixassem a cidade que haviam ocupado há já 7 anos.
Na ausência de parte da frota – afinal, perdida nos
mares do Kwanza Sul – os holandeses pediram um período de 8 dias para
reflectirem sobre a proposta de rendição do Almirante luso-brasileiro. Esse
apenas tolerou 3 dias, ao fim dos quais desencadeou um forte ataque aos
ocupantes entrincheirados na Fortaleza de São Miguel.
A sobreavaliação das forças atacantes feita pelos
holandeses foi-lhes fatal. Daí que tenham perdido as suas posições em Luanda,
seguindo-se Benguela, Porto Amboim (chamada Benguela-a-Velha), o porto de
Pinda, e até mesmo, São Tomé.
Do ponto de vista da história da reconquista de Angola
aos holandeses – vista pelos portugueses – é mais destacado o facto de Salvador
Correia de Sá e Benevides tê-los desalojado, desvalorizando-se, porém, a
intervenção da Rainha Ginga nessa empreitada ao lado dos holandeses, numa
procura de equilíbrios possíveis, conforme era sua prática. Esta dimensão da
história, sem querer forjar uma história à medida, deve ser mais da nossa
responsabilidade, enquanto parte interessada.
Porém, do ponto de vista de eventuais interesses
arqueológicos, não seria também muito estimulante debruçarmo-nos sobre o que
estaria no bojo do Navio Almirante da Armada de Salvador Correia de Sá, quando
se afundou defronte do Quicombo? Sempre que passo por aquela zona do nosso
país, penso nisso, com enorme curiosidade…
Consta ainda que, para além dos 1.200 soldados e
marinheiros, Salvador Correia de Sá e Benevides fazia-se igualmente acompanhar
por um bom número de índios, muitos dos quais estavam em terra, quando ocorreu
o maremoto, seguido de tsunami. Nunca mais foram vistos – e nunca se fala
deles… Possivelmente, ter-se-ão embrenhado no Planalto e, depois, misturado com
as populações locais, emprestando alguma mistura étnica aos povos locais, de
que se terá perdido a origem, nas brumas do longo tempo passado…
Imagem:
maremoto em Angola
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