sexta-feira, 31 de julho de 2009

TARZAN


(EUA, 1912 ; 1929 na BD)
"Tarzan dos Macacos" - "o rei da selva" (continente africano - século xx)

Nascido em 1912, fruto da imaginação e da inspiração do escritor norte-americano Edgar Rice Burroughs (1875-1950), "Tarzan" é talvez o maior mito do século XX e a mais duradoura referência da moderna cultura popular, surgida do cruzamento do sonho com as técnicas de marketing. Com efeito, não será exagero considerar "Tarzan" o mais célebre herói de ficção do século passado, ultrapassando em popularidade outros heróis igualmente famosos, tais como "Tintin", "Astérix", "Rato Mickey", "Super Homem", "Flash Gordon", "Mandrake", "Fantasma", "Príncipe Valente", entre muitos outros.

"Tarzan" conseguiu, de facto, o feito extraordinário de estender o seu domínio a áreas tão diversificadas como a literatura, o cinema, a televisão, a rádio, a banda desenhada, os desenhos animados ou os jogos de vídeo. Ironicamente e de forma paradoxal, constata-se que se, por um lado, é ao cinema que a figura do "Rei da Selva" deve a sua fama universal e imortalidade, por outro lado, foi essa mesma "Sétima Arte" que mais distorceu o espírito inicial da criação do genial Edgar Rice Burroughs.
Foi na edição de Outubro de 1912 da revista mensal "The All-Story" que começou a ser publicada uma espécie de fábula moderna intitulada "Tarzan of the Apes" ("Tarzan dos Macacos"), assinada pelo escritor Norman Bean, pseudónimo usado, inicialmente, por Edgar Rice Burroughs. Perante o êxito alcançado pela narrativa - que contava as atribulações e peripécias vividas pelo filho de um lorde inglês (Greystoke) que é educado por gorilas e chimpanzés na floresta equatorial africana - tanto o público leitor como o editor pediram a Burroughs que acrescentasse mais episódios e prolongasse as histórias por mais uns tempos.

A história de "Tarzan" inicia-se quando, na sequência de um naufrágio, o casal aristocrático inglês, Lord Greystoke, esposa e filho conseguem chegar a uma praia, na costa africana. Os seus pais morrem pouco tempo depois e deixam orfão o pequeno branco indefeso, que é recolhido e protegido por "Kala", uma grande fêmea gorila que o livra de uma morte certa. Criado no seio dos símios superiores na mais completa liberdade, o jovem "Tarzan" vai, progressivamente, adquirindo uma notável robustez e agilidade físicas e aprende, inclusivamente, a linguagem dos animais.

Mais tarde, "Tarzan" conhece uma rapariga chamada "Jane", que se torna a sua inseparável companheira de muitas aventuras pelos quatro cantos do planeta, penetrando em mundos fantásticos, como, por exemplo, quando descem ao centro da Terra ou visitam civilizações míticas perdidas na alvorada dos tempos.

Entretanto, "Tarzan" adquire um profundo sentido de humanidade e de justiça, pondo-se ao serviço dos indefesos e de causas nobres, combatendo tribos selvagens e homens brancos gananciosos e desonestos. Quando um dia, "Tarzan" descobre as suas próprias origens, regressa a Inglaterra e a Londres para uma curta estadia, mas rapidamente chega à conclusão de que o mundo dito civilizado e os costumes burgueses não são feitos para ele e decide, assim, regressar definitivamente à selva africana.
Edgar Rice Burroughs destacou-se, sobretudo, pela sua inteligência intuitiva, possuindo uma grande inspiração criativa e imaginação, aliando a estas qualidades, um extraordinário dom de contar histórias e de criar climas de suspense. A África que utiliza para pano de fundo das suas narrativas e aventuras nada tem que ver com o continente real, pois trata-se de uma África "fantasma", "imaginária" e "irreal", habitada por povos estranhos, descendentes de antigos fenícios, romanos ou cruzados.

A aventura "The Return of Tarzan" ("O Regresso de Tarzan"), dada à estampa em 1913 e assinada já com o verdadeiro nome do autor, seguir-se-iam, em revista e em livro, até 1944 (seis anos antes da morte de Burroughs) mais algumas dezenas de títulos, num total de 43, incluindo romances e contos traduzidos para o mundo inteiro. A partir de 1918, as aventuras de "Tarzan" são adaptadas ao cinema, tendo sido produzidos, desde então e até hoje, cerca de 50 filmes deste herói, incluindo desenhos animados produzidos pela "Disney".

A adesão popular às histórias de Edgar Rice Burroughs foi de tal modo imediata que conduziu à exploração do herói em muitas e variadas direcções, entre as quais (a que nos interessa para o caso), a banda desenhada. Ao contrário do que se passou com o cinema, onde a transposição do espírito de Burroughs nunca foi totalmente conseguida, a banda desenhada só muito raramente se afastou do universo concebido pelo inventor de "Tarzan".

No início do ano de 1929, "Tarzan" passa também a ser adaptado para banda desenhada, aparecendo as suas aventuras oficialmente nos jornais diários americanos, distribuídos pelo "Metropolitan Newspaper Syndicate" (um ano mais tarde integrado no "United Features Syndicate"), sob a forma de tiras diárias assinadas por Harold Foster, um prestigiado publicitário reconvertido, entretanto, ao realismo figurativo da banda desenhada.

Harold Foster, o primeiro autor das tiras diárias, que aparecem pela primeira vez a 7 de Janeiro de 1929, desenha, assim, as 60 primeiras tiras, seguindo-se a este na série (que termina em 1973) os seguintes artistas: Rex Maxon (1929-36), William Juhré (1936-38), novamente Rex Maxon (1938-47), Burne Hogarth (1947), Dan Barry (1948-49), John Letti (1949), Paul Reinman (1949), Nicholas Viskardy (1950), Bob Lubbers (1950-54), John Celardo (1954-67) e Russ Manning (1967-73).
Relativamente às "sunday pages" (páginas dominicais), surgidas pela primeira vez a 15 de Março de 1931, com a assinatura de Rex Maxon, obrigatórias, ainda hoje em dia, nos jornais americanos de domingo, estas foram desenhadas sucessivamente por Rex Maxon (1931), Harold Foster (1931-1937), Burne Hogarth (1937-1945), Reuben Moreira (1945-47), Burne Hogarth (1947-50), Bob Lubbers (1950-54), John Celardo (1954-68), Russ Manning (1968-79), Gil Kane (1979-81), Mike Grell (1981-83) e Gray Morrow (de 1983 até ao presente).

Tal como fará, a partir de Fevereiro de 1937, na ilustração das pranchas da série de banda desenhada "Prince Valiant", também nas pranchas de "Tarzan", Harold Foster faz a ilustração acompanhada com textos em rodapé que comentam e dirigem a narrativa, rejeitando os balões como forma de integração dos diálogos. A partir de 27 de Setembro de 1931, Foster assume a produção da série nos dois formatos, passando a encarregar-se também da página dominical a cores. A série passa, então, a ter um sentido criativo único, com o predomínio da dimensão pictórica sobre a componente narrativa.

Não obstante a marca de qualidade e de talento deixada, ao longo dos anos, pelos vários artistas que se ocuparam de "Tarzan", nomeadamente Harold Foster, deve-se destacar, por ser de inteira justiça, acima de todos, Burne Hogarth, por muitos considerado o mais famoso e o melhor ilustrador/desenhador de "Tarzan", tendo, inclusivamente, ficado conhecido, com todo o mérito, por "Miguel Ângelo da Banda Desenhada". Hogarth tornou-se ainda célebre pelas suas numerosas obras sobre a anatomia dinâmica do corpo humano, técnica e arte que ele estudou profundamente e que aplicou também no desenho de "Tarzan".

Burne Hogarth sucede precisamente a Harold Foster (que passa a dedicar-se, em exclusivo, a partir de Fevereiro de 1937, à sua famosa criação, o herói medieval "Prince Valiant") na ilustração das páginas dominicais de "Tarzan". Assim, a partir de 9 de Maio de 1937 e durante 13 anos (apenas interrompidos durante um período de pouco mais de 1 ano), Hogarth trabalha de uma forma entusiástica e apaixonada, conferindo a "Tarzan" um esplendor "barroco" nunca mais atingido depois dele, expondo o herói em poses anatómicas de grande plasticidade e dinamismo.

Russ Manning foi outro importante artista de banda desenhada que se ocupou da série "Tarzan" e foi, inclusivamente, de todos os autores, aquele que se manteve mais fiel ao espírito da obra de Edgar Rice Burroughs, tendo começado a desenhar "Tarzan" a partir do fim da década de 60, quer nas pranchas diárias, quer nas páginas dominicais.

Apesar de, desde 1929 até aos nossos dias, terem passado diversos autores e artistas pela série "Tarzan", nunca a figura do "Rei da Selva" foi tão exaltada e glorificada como pelo génio de três grandes mestres: Harold Foster, Burne Hogarth e Russ Manning. Na verdade, fica-se a dever, sobretudo, a estes três artistas norte-americanos uma das mais portentosas criações da banda desenhada mundial, que, além de dar outra dimensão ao mito criado por Edgar Rice Burroughs, renovou por completo a técnica, a estética e a temática das "histórias aos quadradinhos".

Contribuição de Alexandre Ribeiro

http://www.bdportugal.info/Comics/Hero/Tarzan/index.html
Imagem: http://michaelmay.us/temp/1122_tarzan.jpg

quinta-feira, 30 de julho de 2009

EÇA DE QUEIRÓS


(*25/11/1845 †16/08/1900)
Resumo biográfico:

Diplomata e escritor muito apreciado em todo o mundo e considerado um dos maiores escritores portugueses de todos os tempos, Eça de Queirós nasceu José Maria Eça de Queirós, em Póvoa de Varzim-Portugal, no dia 25 de Novembro de 1845. Seu nome muitas vezes tem sido, de forma equivocada, grafado como "Eça de Queiroz".

Eça de Queirós morreu em Paris-França, no dia 16 de Agosto de 1900 (Funeral em Lisboa - 17 de Agosto)

Era filho do Dr. José Maria Teixeira de Queirós, juiz do Supremo Tribunal de Justiça, e de sua mulher, D. Carolina de Eça. Depois de ter estudado nalguns colégios do Porto matriculou-se na faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, completando a sua formatura em 1866. Foi depois para Leiria redigir um jornal político, mas não tardou que viesse para Lisboa, onde residia seu pai, e em 1867 estabeleceu-se como advogado, profissão que exerceu algum tempo, mas que abandonou pouco depois, por não lhe parecer que pudesse alcançar um futuro lisonjeiro. Era amigo íntimo de Antero de Quental, com quem viveu fraternalmente, e com ele e outros formou uma ligação seleta e verdadeira agremiação literária para controvérsias humorísticas e instrutivas. Nessas assembléias entraram Ramalho Ortigão, Oliveira Martins, Salomão Saraga e Lobo de Moura.

Estabeleceram-se então, em 1871, as notáveis Conferências Democráticas no Casino Lisbonense (V. Conferência), e Eça de Queirós, na que lhe competiu, discursou acerca do "O Realismo como nova Expressão de Arte", em que obteve ruidoso triunfo. Decidindo-se a seguir a carreira diplomática, foi a um concurso em 21 de Julho de 1870, sagrando-se o primeiro colocado e, em 1872, obteve a nomeação de cônsul geral de Havana, para onde partiu. Permaneceu poucos anos em Cuba, no meio das terríveis repressões do governo espanhol.

Em 1874 foi transferido para Newcastle; em 1876 para Bristol e, finalmente em 1888, para Paris, onde veio a falecer. Eça de Queirós era casado com a Sr.ª D. Emília de Castro Pamplona, irmã do conde de Resende. Colaborou na Gazeta de Portugal, Revolução de Setembro, Renascença, Diário Ilustrado, Diário de Notícias, Ocidente, Correspondência de Portugal, e em outras publicações.

Para o Diário de Notícias escreveu especialmente o conto 'Singularidades duma Rapariga Loura' (1873), publicada como 'livre brinde' aos assinantes do jornal, em 1874, e a descrição das festas da abertura do canal do Suez, a que ele assistiu em 1870, publicada com o título 'De Port Said a Suez', no referido jornal, folhetim de 18 a 21 de Janeiro do mesmo ano de 1870. Na Gazeta de Portugal, de 13 de Outubro de 1867, publicou um folhetim com o título 'Lisboa', seguindo-se as 'Memórias de uma Freira' e 'O Milhafre'; em 29 de Agosto de 1869, o soneto 'Serenata de Satã às Estrellas'.

Fundou a Revista Portugal com a colaboração dos principais e mais célebres homens de letras do seu tempo. Saíram desta revista 24 números, que formam 4 tomos de 6 números cada um. Para este jornal é que escreveu as 'Cartas de Fradique Mendes'. Na Revista Moderna publicou o romance 'A Ilustre Casa de Ramires'.

Bibliografia:
- 'A Morte de Jesus', no folhetim Revolução de Setembro (12, 13, 14, 27 e 28 de Abril, e 11 de Maio de 1870);
- 'O Mistério da Estrada de Sintra' (1870), em colaboração com Ramalho Ortigão, publicadas em 1871, no Diário de Notícias, e depois na coleção da Parceria Pereira, de que se tem feito várias edições;
- O Crime do Padre Amaro (1876 - 2ª versão), primeira em 15/Fev/1875;
- O Primo Basílio (1878);
- O Mandarim (1880), publicado no Diário de Portugal;
- Outro Amável Milagre (1885), in AAVV, Um Feixe de Penas, Lisboa, Tipografia de Castro & Irmão;
- Festa de crianças (1885), in AAVV, Beja-Creche, Coimbra, Imprensa da Universidade;
- A Relíquia, Porto (1887), Livraria Internacional de Ernesto Chardron, de Lugan e Genelioux, Sucessores;
- Os Maias - 2Vols. (1888), Porto, Livraria Internacional de Ernesto Chardron, de Lugan e Genelioux, Sucessores;
- Fraternidade (1890), in AAVV, Anátema, Coimbra, Gaillaud, Aillaud & C.ª;
- 'As Farpas' (1890/91), crônica mensal da política, das letras e dos costumes, por Eça de Queirós e Ramalho Ortigão, iniciada em Maio de 1871- Uma Campanha Alegre - de As Farpas (2vols - 1890/91), Lisboa, Companhia Nacional Editora;
- As Minas de Salomão (trad.) (1891), de Rider Haggard, Porto, Livraria Internacional de Ernesto Chardron, de Lugan e Genelioux, Sucessores;
- Almanaques (prefácio - 1895), in Almanaque Enciclopédico para 1896, Lisboa, Livraria A. M. Pereira;
- Um Génio que era um Santo (1896), in AAVV, In Memoriam de Antero de Quental, Porto, Mathieu Lugan;
- A Duse (1898), in AAVV A Duse, Lisboa, Tipografia da Companhia Nacional Editora;
- A Correspondência de Fradique Mendes (1900) - em 1889 na Revista de Portugal;
- A Ilustre Casa de Ramires (1900);
- A Cidade e as Serras (1900);
- Episódios da Vida Romântica, em 2 tomos;
- Eusébio Macário;

As obras de Eça de Queirós, na maior parte, têm tido diversas edições, tanto em Lisboa como no Porto. Colaborou no livro 'In Memoriam', em homenagem a Antero de Quental. São de Eça de Queirós os interessantes prólogos dos Almanachs Encyclopedicos de 1896 e 1897, por ele dirigidos e publicados pelo falecido editor António Maria Pereira. Eça de Queirós, quando faleceu, estava trabalhando em romances inspirados nas lendas de S. Cristóvão e de S. Frei Gil, o celebrado bruxo português. Devido à iniciativa de amigos dedicados do falecido escritor, elevou-se uma estátua em mármore para perpetuar a sua memória, a qual está situada no Largo de Quintela. É uma verdadeira obra artística do escultor Teixeira Lopes. Figura Eça de Queirós curvado sobre a Verdade, lendo-se no pedaço de mármore tosco, que serve de pedestal à Estátua da Verdade, estas palavras, que foram ali esculpidas. «Sobre a nudez forte da Verdade, o manto diáfano da fantasia».
A inauguração realizou-se no dia 9 de Novembro de1903, discursando os Srs. Conde de Arnoso e de Ávila, Ramalho Ortigão, Dr. Luís de Magalhães, Aníbal Soares e Antônio Cândido; o ator Ferreira da Silva recitou uma poesia do Sr. Alberto de Oliveira, falando por último o Sr. Conde de Resende, cunhado de Eça de Queirós, agradecendo muito comovido, em nome da família do falecido escritor, a homenagem prestada à sua memória.

Transcrito por Manuel Amaral

http://www.nossosaopaulo.com.br/Reg_SP/Barra_Escolha/B_EcaDeQueiros.htm

terça-feira, 28 de julho de 2009

Sousa Jamba




Sousa Jamba (Missão de Dondi, Angola, 9 de Janeiro de 1966) é um escritor e jornalista angolano.

Origem: WIKIPEDIA, a enciclopédia livre.

Entre 1976 e 1984, em consequência da guerra, emigrou para a Zâmbia, onde fez os estudos em língua inglesa e com a qual começou a sua produção literária. Em seguida, regressou a Angola, trabalhando como jornalista nas zonas controladas pela União Nacional da Independência Total de Angola (UNITA).

Em 1986, adquiriu uma bolsa para estudar na Grã-Bretanha, onde fez estudos superiores e de jornalismo. Como jornalista, foi repórter da UNITA, e tem desenvolvido actividades nos Estados Unidos, Brasil, Portugal e Grã-Bretanha, colaborando regularmente com jornais como The Spectator, O Independente e Terra Angolana.

Escritor-residente em diversas universidades da Escócia, Sousa Jamba publicou as suas primeiras obras em inglês: Patriots (1990, Patriotas , tradução portuguesa,1991), On the Banks of the Zambezi (1993), A Lonely Devil (1994, Confissão Tropical , tradução portuguesa, 1995).

Imagem: http://www.wook.pt/ficha/patriotas/a/id/95623

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Van Gogh


30/03/1853, Groot-Zundert, Holanda. 29/07/1890, Auvers-sur-Oise, França
Da Redação em São Paulo

A genialidade de Vincent Van Gogh somente foi reconhecida após a sua morte. Em vida, o artista holandês, que passou fome e frio, viveu em barracos e conheceu a miséria, vendeu apenas uma pintura _ "O Vinhedo Vermelho". Em maio de 1990, uma de suas mais conhecidas obras, "O Retrato de Dr. Gachet", pintado um século antes, justamente no ano de sua morte, foi comercializado por US$ 82,5 milhões.

Maior expoente do pós-impressionismo, ao lado de Paul Gauguin e Paul Cézanne, Vicent Willen Van Gogh, foi sempre sustentado pelo irmão Theodorus, com quem trocou mais de 750 correspondências, documentos fundamentais para um estudo mais aprofundado de sua arte. Na sua fase mais produtiva (1880/90), Van Gogh foi completamente ignorado pela crítica e pelos artistas. Atualmente, os seus quadros estão entre os mais caros do mundo.

Na infância, Van Gogh aprendeu inglês, francês e alemão. Mas, com apenas 15 anos, deixou os estudos para trabalhar na loja de um tio, em Haia (Holanda). Com 24 anos, achou que a sua vocação era trabalhar com a evangelização, chegando a estudar teologia, em Amsterdã. Pouco tempo depois, dividiu os seus poucos bens com os pobres e passou a ser sustentado pelo irmão, ao mesmo tempo em que iniciava a carreira profissional como pintor.

Van Gogh, que também morou na França e na Bélgica (onde conviveu com mineiros extremamente pobres), pintou mais de 400 telas _os três anos anteriores à sua morte foram os mais produtivos. Uma mudança fundamental na vida do pintor holandês aconteceu quando Van Gogh trocou Paris por Arles, mais ao sul da França. Na pequena cidade, Van Gogh aluga uma casa e intensifica o seu trabalho, ao lado de Gauguin.

Após um período de ótima convivência, os dois pintores começam a discutir muito e Van Gogh ataca Gauguin com uma navalha em dezembro de 1888. Inconformado com o fracasso do ataque e completamente transtornado, Van Gogh corta o lóbulo de sua orelha esquerda com a própria arma. Em seguida, embrulha o lóbulo e o entrega a uma prostituta. Internado em um hospital, recebe a visita do irmão Theodorus. No começo de janeiro de 1889, Van Gogh deixa o hospital, mas apresenta sinais evidentes de disfunção mental _às vezes, aparenta tranqüilidade, em outras oportunidades, demonstra alucinações.

Internado pelo irmão em um asilo, Van Gogh não deixa de pintar. Por ironia, à medida que a sua saúde fica ainda mais deteriorara, a classe artística começa a reconhecer o seu talento, expondo alguns de seus trabalhos em museus. Quando deixou o asilo, o pintor holandês foi morar nas imediações da casa de seu irmão. Nesta época, pinta, em média, um quadro por dia. Depois de ver os seus problemas mentais serem agravados, Theodorus decide que Van Gogh será tratado pelo médico Paul Gachet. Em maio de 1890, aparentando estar recuperado, Van Gogh passa a morar em Auvers-sur-Oise, a noroeste de Paris, onde pinta freneticamente.

Em julho, uma nova recaída no estado de saúde do pintor holandês, que também demonstra inconformismo com as dificuldades financeiras enfrentadas pelo seu irmão. No dia 27, Van Gogh sai para fazer um passeio e toma uma decisão drástica _atira contra si mesmo, no tórax. Cambaleando, volta para a sua casa, mas não comenta com ninguém que tinha tentado o suicídio. Encontrado por amigos, Van Gogh passa as últimas 48 horas de sua vida, conversando com o seu irmão _os médicos não conseguiram retirar a bala do tórax. No dia 29, pela manhã, o pintor morreu e o seu caixão foi coberto com girassóis, flor que ela amava. Aliás, a tela "Os Girassóis" é uma das obras-primas de Van Gogh.

http://educacao.uol.com.br/biografias/ult1789u242.jhtm
Imagem: http://www.wisdom.weizmann.ac.il/

sábado, 25 de julho de 2009

Questões sociais e políticas antes da unificação ortográfica


Manchete - 3-Jul-2009 - 10:48

JB ONLINE

Quem o diz é o escritor moçambicano Mia Couto

Antes da unificação da grafia da língua portuguesa nos países africanos que falam (?) o português, é preciso discutir questões do âmbito social e político, defende Mia Couto para quem a reforma ortográfica não faz sentido.

"Eu não tenho uma posição militante em relação a isso, não dou essa importância. Reconheço que pode haver algumas razões para se fazer uma reforma ortográfica. Eu sou crítico ao discurso que foi feito para justificar o acordo para ficarmos mais próximos, para nos entendermos melhor, isso é mesmo mentira", disse.

Para Mia Couto, os falantes da língua portuguesa já se entendem, "é mentira que tenhamos nos afastado do ponto de vista cultural do conhecimento". E complementa que "nós já nos entendemos, eu sempre li brasileiros sem dificuldade nenhuma".

De acordo com o sócio correspondente da Academia Brasileira de Letras que está no Rio de Janeiro para o Festival de Teatro da Língua Portuguesa, o que afasta o mundo lusófono são as "opções políticas e estratégias que as elites desses países têm". Se estas questões não forem discutidas, segundo disse à Lusa o escritor moçambicano, "vamos criar um mal entendido pensando que automaticamente, por uma razão técnica, nós vamos chegar a uma maior proximidade".

Mia Couto diz sentir prazer em ler autores brasileiros com "elementos gráficos diferentes para que essa diversidade esteja presente". E refere não ter "medo de uma língua que tenha diversidades com a tradução de marcas culturais e geográficas, não temos que ter medo disso".

Ele afirma-se resistente ao Acordo Ortográfico que no Brasil vigora desde 1 de Janeiro deste ano. Para o escritor, os países pobres de língua portuguesa precisam "resolver uma série de outras coisas antes (da reforma) que não sei se estão a ser discutidas".

"Entendo que em Portugal este assunto foi tido com muito mais nervos e componentes psicológicos" e contrapôs que em Moçambique, um país com mais de 25 línguas africanas, o português é tido como segunda língua. "As pessoas lá são quase sempre multilíngues, pois falam duas ou três línguas africanas."

Com seu livro recém lançado no Brasil "Antes de nascer o mundo", cujo título em Portugal e em Moçambique é "Jesusalém", Mia Couto considera-se antes de tudo um poeta e diz que o que lhe fascina na prosa é o "poder fazer a criação poética, não só em cima da linguagem, mas em cima da narrativa".

"Para mim a poesia não é só um gênero literário, é uma maneira de eu ver o mundo, de eu sentir o mundo", salientou ao destacar que a literatura ainda pode causar encantamento e criar utopias.

"A literatura pode mostrar o gosto de se poder sonhar e se poder construir outros dias. Não é o escritor que desenha um caminho para a saída, mas ele mostra que há um prazer em encontrar um mundo para além desse", declarou.

Após 16 anos de guerra civil com um saldo de um milhão de mortos, Mia Couto se diz céptico, mas que a literatura pode ajudar a cicatrizar as feridas.

"Eu faço arte, literatura, e sou movido por este desejo de ter um compromisso ético de criar uma sociedade nova em Moçambique, um mundo mais justo com mais verdade", explicou.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Jorge Amado



10/8/1912, Itabuna (BA)
6/8/2001, Salvador (BA)
Da Página 3 Pedagogia & Comunicação
Amado foi eleito para a cadeira número 23 da ABL em 1961

Jorge Amado nasceu na fazenda Auricídia, em Ferradas, município de Itabuna. Filho do "coronel" João Amado de Faria e de Eulália Leal Amado, foi para Ilhéus com apenas um ano e lá passou a infância e descobriu as letras. A adolescência ele viveria em Salvador, no contato com aquela vida popular que marcaria sua obra.

Aos 14 anos, começou a participar da vida literária de Salvador, sendo um dos fundadores da Academia dos Rebeldes, grupo de jovens que (juntamente com os do Arco & Flecha e do Samba) desempenhou importante papel na renovação das letras baianas. Entre 1927 e 1929, foi repórter no "Diário da Bahia", época em que também escreveu na revista literária "A Luva".

Estreou na literatura em 1930, com a publicação (por uma editora carioca) da novela "Lenita", escrita em colaboração com Dias da Costa e Édison Carneiro. Seus primeiros romances foram "O País do Carnaval" (1931), "Cacau" (1933) e "Suor" (1934).

Jorge Amado bacharelou-se em ciências jurídicas e sociais na Faculdade de Direito no Rio de Janeiro (1935), mas nunca exerceria a profissão de advogado. Em 1939, foi redator-chefe da revista "Dom Casmurro". De 1935 a 1944, escreveu os romances "Jubiabá", "Mar Morto", "Capitães de Areia", "Terras do Sem-Fim" e "São Jorge dos Ilhéus".

Em parte devido ao exílio no regime getulista, Jorge Amado viajou pelo mundo e viveu na Argentina e no Uruguai (1941-2) e, depois, em Paris (1948-50) e em Praga (1951-2).

Voltando para o Brasil durante o segundo conflito mundial, redigiu a seção "Hora da Guerra" no jornal "O Imparcial" (1943-4). Mudando-se para São Paulo, dirigiu o diário Hoje (1945). Anos depois, no Rio, participaria da direção do semanário "Para Todos" (1956-8).

Em 1945, foi eleito deputado federal por São Paulo, tendo participado da Assembléia Constituinte de 1946 (pelo Partido Comunista Brasileiro) e da primeira Câmara Federal posterior ao Estado Novo. Nessa condição, foi responsável por várias leis que beneficiaram a cultura. De 1946 a 1958, escreveria "Seara Vermelha", "Os Subterrâneos da Liberdade" e "Gabriela, Cravo e Canela".

Em abril de 1961, foi eleito para a cadeira número 23 da Academia Brasileira de Letras (sucedendo a Otávio Mangabeira). Na década de 1960, lançou os romances "A Morte e a Morte de Quincas Berro d'Água", "Os Velhos Marinheiros, ou o Capitão de Longo Curso", "Os Pastores da Noite", "Dona Flor e Seus Dois Maridos" e "Tenda dos milagres". Nos anos 1970, viriam "Teresa Batista Cansada de Guerra", "Tieta do Agreste" e "Farda, Fardão, Camisola de Dormir".

Suas obras foram traduzidas para 48 idiomas. Muitas se viram adaptados para o cinema, o teatro, o rádio, a televisão e até as histórias em quadrinhos, não só no Brasil, mas também em Portugal, França, Argentina, Suécia, Alemanha, Polônia, Tchecoslováquia (atual República Tcheca), Itália e EUA. Seus últimos livros foram "Tocaia Grande" (1984), "O Sumiço da Santa" (1988) e "A Descoberta da América pelos Turcos" (1994).

Além de romances, escreveu contos, poesias, biografias, peças, histórias infantis e guias de viagem. Sua esposa, Zélia Gattai, é autora de "Anarquistas, Graças a Deus" (1979), "Um Chapéu Para Viagem" (1982), "Senhora Dona do Baile" (1984), "Jardim de Inverno" (1988), "Pipistrelo das Mil Cores" (1989) e "O Segredo da Rua 18" (1991). O casal teve dois filhos: João Jorge, sociólogo e autor de peças infantis; e Paloma, psicóloga.

Jorge Amado morreu perto de completar 89 anos, em Salvador. A seu pedido, foi cremado, e as cinzas, colocadas ao pé de uma árvore (uma mangueira) em sua casa.
http://educacao.uol.com.br/biografias/ult1789u310.jhtm

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Mia Couto


Origem: WIKIPEDIA, a enciclopédia livre.

Mia Couto (Beira, 1955) é um escritor moçambicano. António Emílio Leite Couto foi nominado Mia devido a seu irmãozinho não conseguir dizer "Emílio". Segundo o próprio autor, a utilização deste apelido tem a ver com sua paixão pelos gatos, dizia a seus familiares desde sua infância que queria ser um deles.

Nasceu na Beira, a segunda cidade de Moçambique, em 1955. Ele disse uma vez que não tinha uma "terra-mãe" - tinha uma "água-mãe", referindo-se à tendência daquela cidade baixa e localizada à beira do Oceano Índico para ficar inundada.

Iniciou o curso de Medicina ao mesmo tempo que se iniciava no jornalismo e abandonou aquele curso para se dedicar a tempo inteiro à segunda ocupação. Foi director da Agência de Informação de Moçambique e mais tarde tirou o curso de Biologia, profissão que exerce até agora. Foi recentemente entrevistado pela revista ISTOÉ [1].

Muitos dos seus livros estão traduzidos em alemão, francês, catalão, inglês e italiano.

Poesia
Estreou-se no prelo com um livro de Poesia - Raiz de Orvalho, publicado em 1983. Mas já antes tinha sido antologiado por outro dos grandes poetas moçambicanos, Orlando Mendes (outro biólogo), em 1980, numa edição do Instituto Nacional do Livro e do Disco, resultante duma palestra na Organização Nacional dos Jornalistas (actual Sindicato), intitulada "Sobre Literatura Moçambicana".

Em 1999, a Editorial Caminho (que publica em Portugal as obras de Mia) relançou Raiz de Orvalho e outros poemas que, em 2001 teve sua 3ª edição.

Contos
Depois, estreou-se nos contos e numa nova maneira de falar - ou "falinventar" - português, que continua a ser o seu "ex-libris". Nesta categoria de contos publicou:
Vozes Anoitecidas (1ª ed. da Associação dos Escritores Moçambicanos, em 1986; 1ª ed. Caminho, em 1987; 8ª ed. em 2006; Grande Prémio da Ficção Narrativa em 1990, ex aequo)
Cada Homem é uma Raça (1ª ed. da Caminho em 1990; 9ª ed., 2005)
Estórias Abensonhadas (1ª ed. da Caminho, em 1994; 7ª ed. em 2003)
Contos do Nascer da Terra (1ª ed. da Caminho, em 1997; 5ª ed. em 2002)
Na Berma de Nenhuma Estrada (1ª ed. da Caminho em 1999; 3ª ed. em 2003)
O Fio das Missangas (1ª ed. da Caminho em 2003; 4ª ed. em 2004)

Crónicas
Para além disso, publicou em livros, algumas das suas crónicas, que continuam a ser coluna num dos semanários publicados em Maputo, capital de Moçambique:
Cronicando (1ª ed. em 1988; 1ª ed. da Caminho em 1991; 7ª ed. em 2003; Prémio Nacional de Jornalismo Areosa Pena, em 1989)
O País do Queixa Andar (2003)
Pensatempos. Textos de Opinião (1ª e 2ª ed. da Caminho em 2005)

Romances
E, naturalmente, não deixou de lado a novela, tendo publicado:
Terra Sonâmbula (1ª ed. da Caminho em 1992; 8ª ed. em 2004; Prémio Nacional de Ficção da Associação dos Escritores Moçambicanos em 1995; considerado por um juri na Feira Internacional do Zimbabwe, um dos doze melhores livros africanos do século XX)
A Varanda do Frangipani (1ª ed. da Caminho em 1996; 7ª ed. em 2003)
Mar Me Quer (1ª ed. Parque EXPO/NJIRA em 1998, como contribuição para o pavilhão de Moçambique na Exposição Mundial EXPO '98 em Lisboa; 1ª ed. da Caminho em 2000; 8ª ed. em 2004)
Vinte e Zinco (1ª ed. da Caminho em 1999; 2ª ed. em 2004)
O Último Voo do Flamingo (1ª ed. da Caminho em 2000; 4ª ed. em 2004; Prémio Mário António de Ficção)
O Gato e o Escuro, com ilustrações de Danuta Wojciechowska (1ª ed. da Caminho em 2001; 2ª ed. em 2003)
Um Rio Chamado Tempo, uma Casa Chamada Terra (1ª ed. da Caminho em 2002; 3ª ed. em 2004; rodado em filme pelo português José Carlos Oliveira)
A Chuva Pasmada, com ilustrações de Danuta Wojciechowska (1ª ed. da Njira em 2004)
O Outro Pé da Sereia (1ª ed. da Caminho em 2006)
O beijo da palavrinha, com ilustrações de Malangatana (1ª ed. da Língua Geral em 2006)
Venenos de Deus, Remédios do Diabo (2008)

Prémios
1999 - Prémio Vergílio Ferreira, pelo conjunto da sua obra
2007 - Prémio União Latina de Literaturas Românicas
2007 - Prêmio Passo Fundo Zaffari e Bourbon de Literatura, na Jornada Nacional de Literatura

Academia Brasileira de Letras
É sócio correspondente da Academia Brasileira de Letras, sexto ocupante da cadeira 5, que tem por patrono Dom Francisco de Sousa, eleito em 1998.

terça-feira, 21 de julho de 2009

José Afonso


WIKIPEDIA, a enciclopédia livre.

Monumento em Grândola
Informação geral
Nome completo José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos
Data de nascimento 2 de Agosto de 1929
Origem Aveiro
País Portugal
Data de morte 23 de Fevereiro de 1987
Gêneros Música de intervenção
Página oficial http://www.aja.pt/

José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos (Aveiro, 2 de Agosto de 1929 — Setúbal, 23 de Fevereiro de 1987), mais conhecido por José Afonso ou Zeca Afonso, foi um cantor e compositor português.

Não obstante o seu trabalho com o fado de Coimbra e a música tradicional, vulgo folk português, realiza também as célebres actuações no TEP (Teatro Experimental do Porto) com Adriano Correia de Oliveira entre outros. José Afonso ficou indelevelmente associado pelo imaginário coletivo à música de intervenção, através da qual criticava o Estado Novo, regime de ditadura vigente em Portugal entre 1933 e 1974.

Biografia
Foi criado pela tia Gé e pelo tio Xico, numa casa situada no Largo das Cinco Bicas, em Aveiro, até aos 3 anos (1932), altura em que foi viver com os pais e irmãos, que estavam em Angola havia 2 anos.

A relação física com a natureza causou-lhe uma profunda ligação ao continente africano que se reflectirá pela sua vida fora. As trovoadas, os grandes rios atravessados em jangadas, a floresta esconderam-lhe a realidade colonial. Só anos mais tarde saberá o quão amarga é essa sociedade, moldada por influências do apartheid.

Em 1937, volta para Aveiro onde é recebido por tias do lado materno, mas parte no mesmo ano para Moçambique, onde se reencontra com os pais e irmãos em Lourenço Marques (agora Maputo), com quem viverá pela última vez até 1938, data em que vai viver com o tio Filomeno, em Belmonte.

O tio Filomeno era, na altura, presidente da câmara de Belmonte. Lá, completou a instrução primária e viveu o ambiente mais profundo do Salazarismo, de que seu tio era fervoroso admirador. Ele era pró-franquista e pró-hitleriano e levou-o a envergar a farda da Mocidade Portuguesa. «Foi o ano mais desgraçado da minha vida», confidenciou Zeca.

Zeca Afonso vai para Coimbra em 1940 e começa a cantar por volta do quinto ano no Liceu D. João III. Os tradicionalistas reconheciam-no como um bicho que canta bem. Inicia-se em serenatas e canta em «festarolas de aldeia». O fado de Coimbra, lírico e tradicional, era principalmente interpretado por si.

Os meios sociais miseráveis do Porto, no Bairro do Barredo, inspiraram-lhe para a sua balada «Menino do Bairro Negro». Em 1958, José Afonso grava o seu primeiro disco "Baladas de Coimbra". Grava também, mais tarde, "Os Vampiros" que, juntamente com "Trova do Vento que Passa" (um poema de Manuel Alegre, musicado e cantado por Adriano Correia de Oliveira) se torna um dos símbolos de resistência antifascista da época. Foi neste período (1958-1959) professor de Francês e de História na Escola Comercial e Industrial de Alcobaça.

Em 1964, parte novamente para Moçambique, onde foi professor de Liceu, desenvolvendo uma intensa actividade anticolonialista o que lhe começa a causar problemas com a polícia política pela qual será, mais tarde, detido várias vezes.

Quando regressa a Portugal, é colocado como professor em Setúbal, mas, devido ao seu activismo contra o regime, é expulso do ensino e, para sobreviver, dá explicações e grava o seu primeiro álbum, "Baladas e Canções".

Entre 1967 e 1970, Zeca Afonso torna-se um símbolo da resistência democrática. mantém contactos com a LUAR (Liga Unitária de Acção Revolucionária) e o PCP o que lhe custará várias detenções pela PIDE. Continua a cantar e participa, em 1969, no 1º Encontro da "Chanson Portugaise de Combat", em Paris e grava também o LP "Cantares do Andarilho", recebendo o prémio da Casa da Imprensa pelo melhor disco do ano, e o prémio da melhor interpretação. Zeca Afonso passa a ser tratado nos jornais pelo anagrama Esoj Osnofa em virtude de ser alvo de censura.

Em 1971, edita "Cantigas do Maio", no qual surge "Grândola Vila Morena", que será mais tarde imortalizada como um dos símbolos da revolução de Abril. Zeca participa em vários festivais, sendo também publicado um livro sobre ele e lança o LP "Eu vou ser como a toupeira". Em 1973 canta no III Congresso da Oposição Democrática e grava o álbum "Venham mais cinco".

Após a Revolução dos Cravos continua a cantar, grava o LP "Coro dos tribunais" e participa em numerosos "cantos livres". A sua intervenção política não pára, tornou-se um admirador do período do PREC e em 1976 apoia Otelo Saraiva de Carvalho na sua candidatura à presidência da república.

Os seus últimos espectáculos decorreram no Coliseu de Lisboa e do Porto, em 1983, quando Zeca Afonso já se encontrava doente. No final desse mesmo ano, é-lhe atribuída a Ordem da Liberdade, mas o cantor recusa.

Em 1985 é editado o seu último álbum de originais, "Galinhas do Mato", em que, devido ao avançado estado da doença, José Afonso não consegue cantar na totalidade. Devido a isso, o álbum foi completado por: José Mário Branco, Helena Vieira, Fausto e Luís Represas. Em 1986, já em fase terminal da sua doença, apoia a candidatura de Maria de Lourdes Pintasilgo à presidência da república.

José Afonso morreu no dia 23 de Fevereiro de 1987, no Hospital de Setúbal, às 3 horas da madrugada, vítima de esclerose lateral amiotrófica. Será certamente recordado como um resistente que conseguiu trazer a palavra de protesto antifascista para a música popular portuguesa e também pelas suas outras músicas, de que são exemplo as suas baladas.

Em 1994 é feita um CD duplo em homenagem a José Afonso a que se chamou "Filhos da Madrugada Cantam José Afonso". No fim de Junho seguinte, muitas das bandas portuguesas que integraram o projecto, participaram num concerto que teve lugar no então Estádio José de Alvalade, antecessor do actual Estádio Alvalade XXI.

Em 24 de Abril de 1994 a CeDeCe-Companhia de Dança Contemporanea, estreia no Teatro S. Luiz em Lisboa o Bailado Dançar Zeca Afonso com música de José Afonso e coreografia de António Rodrigues, uma encomenda Lisboa94-Capital Europeia da Cultura.

Notas
↑ Assinava os seus discos como José Afonso
↑ Inversão do nome José Afonso
↑ Apesar da recusa por Zeca Afonso, mais tarde, em 1994, é feita nova tentativa e já a título póstumo, mas a sua mulher também recusa, dizendo que, se o marido a não tinha aceitado em vida, não seria depois de morto que a iria receber.
↑ Filhos da Madrugada - Cantam José Afonso - Instituto de Camões

Imagem: José Afonso retratado por Henrique Matos

domingo, 19 de julho de 2009

Ferreira de Castro



Nome: José Maria Ferreira de Castro
Nascimento: 24-5-1898, Oliveira de Azeméis
Morte: 1974, Lisboa

Escritor português, grande precursor do Neo-Realismo em Portugal, nasceu em Oliveira de Azeméis em 1898 e faleceu em 1974. Depois de ter terminado os estudos primários, emigrou para o Brasil, para trabalhar como empregado de armazém no seringal Paraíso, na selva amazónica. Viveu durante alguns anos em Belém do Pará, aí prosseguindo com grandes dificuldades as suas primeiras tentativas literárias e publicando o romance juvenil Criminoso por Ambição. Em 1919, regressa a Portugal, ingressando no jornalismo, colabora com várias publicações; funda a revista A Hora: revista panfleto de arte, actualidades e questões sociais (1922), o jornal O Luso, o grande magazine mensal Civilização (1928-1937); colabora com O Diabo e com O Século e edita as suas primeiras obras.

Entre 1923 e 1927 publica várias novelas - que viria mais tarde a renegar - até, em 1928, ao publicar Emigrantes (história de um pobre aventureiro fracassado) se consagrar como romancista numa ficção onde a pesquisa estética é submetida a ideais humanísticos e sociais. Em 1903 publica A Selva, um dos livros portugueses mais traduzidos em todo o mundo, concebido sob a forma de romance, que foca o drama dos trabalhadores dos seringais na Amazónia e corresponde a uma fase humanista, não excluindo uma objectividade quase fotográfica, com muito de reportagem e de situações vivamente descritas. Com efeito, a publicação de Emigrantes, seguida de A Selva, alcançando um êxito extraordinário, no Brasil e noutros países, apontava, segundo Álvaro Salema, in Ferreira de Castro - A sua vida, a sua personalidade, a sua obra, Lisboa, 1974, "insuspeitadas possibilidades de um realismo novo".

A grande força do fulgurante itinerário romanesco de Ferreira de Castro, segundo o mesmo estudioso, "não era apenas a de um realismo novo, vivido e posto à prova, igualmente, numa experiência pessoal dramaticamente sofrida e na observação franca, corajosa e simples de mundos humanos nunca anteriormente revelados. Não era, somente, a de uma técnica narrativa colhida directamente da verdade existencial, com limitado apport de leituras antecipantes, e servida por um estilo singelo, de expressão clara e imediatamente comunicativa, tão sugestionadora para o leitor de escol que soubesse entendê-las nessa autenticidade como para o homem do povo sem formação prévia de leitor. A força maior da criação literária que Ferreira de Castro vinha desvendar era, afinal, a de uma nova forma de humanismo, representada na ficção romanesca."

Com Terra Fria e A Lã e a Neve, o autor procede a uma nova metodologia de criação romanesca, baseada na observação in loco do meio e problemas sociais que o romance focaliza, num esboço de história natural, onde tenta transmitir um mundo rural miserável, à margem da civilização, protagonizado por gente simples e despecuniada. As dificuldades levantadas pelo regime salazarista à livre expressão do pensamento obrigam, posteriormente, o autor a abandonar o ciclo romanesco que se propusera para se dedicar às impressões de viagem, dedicando-se, entre 1959 e 1963, à publicação de As Maravilhas Artísticas do Mundo ou a Prodigiosa Aventura do Homem Através da Arte. Deste modo, para Álvaro Salema, as obras de Ferreira de Castro inscrevem-se em três grandes categorias: um primeiro ciclo de romances inspirado na "experiência pessoal" e na "observação experimentada", a que correspondem os romances Emigrantes, A Selva, Eternidade, Terra Fria e A Lã e a Neve; os livros de "viajante, empenhado com inteira adesão de vida interior na descoberta e desvendamento da experiência histórica e social da humanidade através das suas expressões multímodas", com Pequenos Mundos e Velhas Civilizações e A Volta ao Mundo; e uma terceira direcção que opera uma "inflexão renovada e renovadora para a análise mais complexa e diversificada dos conflitos interiores em equação com realidades sociais e históricas mais vastas", consubstanciada nos romances A Curva da Estrada, O Instinto Supremo e A Missão (id. Ibi., p. 40).

Recebendo homenagens literárias em vários países e vendo os seus livros traduzidos em várias línguas, Ferreira de Castro assistiria ao culminar do reconhecimento da sua obra com uma vibrante celebração do seu cinquentenário de vida literária, em Portugal e no Brasil, e com, após a publicação de O Instinto Supremo, em 1968, a apresentação pela União Brasileira de Escritores da candidatura conjunta de Ferreira de Castro e de Jorge Amado ao Prémio Nobel de Literatura. Esta adesão à obra de Ferreira de Castro é indissociável da admiração que grande número de leitores votou à atitude de inflexível resistência do escritor, à sua determinação de não compactuar de qualquer modo com o regime, postura manifestada, por exemplo, na decisão de não colaborar com a imprensa portuguesa enquanto vigorasse o regime de censura, no facto de não permitir que nenhuma obra sua fosse adaptada a um cinema financiado pelo Estado ou na adesão a movimentos democráticos. Recebeu, entre outras distinções, o Prémio Internacional Águia de Ouro do Festival do Livro de Nice e foi eleito, em 1962, presidente da Direcção da Sociedade Portuguesa de Escritores.

Bibliografia: Mas..., s/l, 1921; O Êxito Fácil, s/l, 1923; Sangue Negro, Lisboa, 1923; A Metamorfose: Novela Contemporânea, s/l, 1924; Lendas de Lirismo e de Amor, Lisboa, 1925; A Epopeia do Trabalho, Lisboa, 1926; A Peregrina do Mundo Novo, Lisboa, 1926; O Voo nas Trevas: novelas, Porto, 1927; A Casa dos Móveis Dourados, Lisboa, 1927; Emigrantes, Lisboa, 1928; A Selva, Rio de Janeiro, 1930; Eternidade, Lisboa, 1933; Terra Fria, Lisboa, 1934; Eternidade, ed. corrigida, s/l, 1935; Pequenos Mundos e Velhas Civilizações, Lisboa, 1937; A Tempestade, Lisboa, 1940; A Volta ao Mundo, Lisboa, 1942; A Curva da Estrada, Lisboa, 1950; As Maravilhas Artísticas do Mundo ou a Prodigiosa Aventura do Homem Através da Arte, Lisboa, 1959-1963; A Lã e a Neve, Rio de Janeiro, 1954; O Instinto Supremo, Lisboa, 1968; Os Fragmentos, Lisboa, 1974; Correspondência: 1922-1969, Lisboa, 1994

Como referenciar este artigo:
Ferreira de Castro. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2009. [Consult. 2009-06-30].
Disponível na www: http://www.infopedia.pt/$ferreira-de-castro>.
Foto: http://ferreiradecastro.blogspot.com/

sábado, 18 de julho de 2009

José da Silva Maia Ferreira


Remetente Maria Cristina Damazio cdamazio@esoterica.pt

JOSÉ DA SILVA MAIA FERREIRA (Benguela, Angola, séc.XIX - Angola, séc.XX). Tendo estudado na cidade de Lisboa, possívelmente obteve instrução superior à primária. Amanuense da Secretaria do Governo Geral de Angola, tesoureiro da alfândega de Benguela, oficial da Secretaria do Governo de Benguela. Candidato às eleições para senadores e deputados, realizadas em 1839. Colaboração no Almanach de Lembranças, Lisboa, 1879.
Publicou, pelo menos: Espontaneidades da minha alma / As senhoras africanas, Luanda, 1849.


BENGUELINHA !

Passarinho primoroso
E gentil, plumeo cantor,
Que d'aromas tão fragrantes
Não esparzes com candor,
Quando trinas mavioso
Nesse insolito rigor
De um sol forte e constante
Suaves cantos d'amor?!

Ás vezes contemplo
Do dia no albor,
Sentir o rigor
De escravo viver;

Suspiras e gemes
Em cantos d'amor,
Ah! sê meu primor
Não queiras morrer!

Anhélas no mato
Andar pelas fragas,
Viver só de bagas,
Nos ramos dormir?

Esvoaça saltando
Na tua prisão
Ai! Tem compaixão
Não vive a carpir!

Infiltra bondoso
No meu coração
O doce condão -
Do meigo trinar;

Que juro contigo
Do muito viver
Comtigo morrer,
Comtigo findar!

E as azas abrindo
O plumeo cantor,
As juras d'amor,
Ouvio a sorrir -

Em magos acentos
Endeixas trinou,
Que d'alma exalou,
Que d'alma sentiu! -



À MINHA TERRA !

(No momento de avista-la depois de uma viagem.)


De leite o mar - lá desponta
Entre as vagas susurrando
A terra em que scismando
Vejo ao longe branquejar!
É baça e proeminente,
Tem d'Africa o sol ardente,
Que sobre a areia fervente
Vem-me a mente acalentar.

Debaixo do fogo intenso,
Onde só brilha formosa,
Sinto n'alma fervorosa
O desejo de a abraçar:
É a minha terra querida,
Toda d'alma, - toda - vida, -
Qu'entre gozos foi fruida
Sem temores, nem pesar.

Bem vinda sejas ó terra,
Minha terra primorosa,
Despe as galas - que vaidosa
Ante mim queres mostrar:
Mesmo simples teus fulgores,
Os teus montes tem primores,
Que às vezes falam de amores
A quem os sabe adorar!

Navega pois, meu madeiro
Nestas aguas d'esmeraldas,
Vai junto do monte ás faldas
Nessas praias a brilhar!
Vae mirar a natureza,
Da minha terra a belleza,
Que é singella, e sem fereza
Nesses plainos d'alem-mar!

De leite o mar, - eis desponta
Lá na extrema do horizonte,
Entre as vagas - alto monte
Da minha terra natal;
É pobre, - mas tão formosa
Em alcantis primorosa,
Quando brilha radiosa,
No mundo não tem igual!

http://www.jornaldepoesia.jor.br/1jsilva.html

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Barack Obama 'esse negrito'


Ministro que chamou Obama de 'negrito' deixa governo em Honduras

REUTERS JB ONLINE

TEGUCIGALPA – O ministro de Governança e ex-chanceler do governo interino de Honduras, que se referiu ao presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, como 'esse negrito', deixou o governo interino na terça-feira alegando pressões dos Estados Unidos.

A porta-voz da embaixada dos EUA em Tegucigalpa, Chantal Dalton, negou as pressões sobre as autoridades que assumiram o país após o golpe de Estado, acrescentando que seu país não mantém contato com um governo que não reconhece.

Enrique Ortez renunciou na semana passada ao cargo de ministro das Relações Exteriores depois de seus comentários sobre Obama, e foi nomeado ministro de Governança e Justiça.

Ortez disse em comunicado que se demitiu por 'pressões da embaixada dos Estados Unidos da América ante nosso povo e governo, direta e indiretamente, junto a certos países da Alba', numa referência ao bloco de países esquerdistas liderado pelo presidente venezuelano, Hugo Chávez.

O presidente interino, Roberto Micheletti, aceitou a renúncia de Ortez.

A derrubada do presidente Manuel Zelaya por militares em 28 de junho recebeu uma ampla condenação internacional, incluindo a dos Estados Unidos, que nesta semana suspenderam os programas de ajuda militar a Honduras e ameaçaram cancelar outros fundos de ajuda ao país num volume de até 180 milhões de dólares.

10:44 - 15/07/2009

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Maria João Pires renuncia à nacionalidade portuguesa


Pianista zangada com autoridades governamentais
03.07.2009 - 09h13 Margarida Gomes

PÚBLICO ÚLTIMA HORA

A pianista Maria João Pires vai renunciar à nacionalidade portuguesa, tornando-se aos 65 anos cidadã brasileira. A notícia é avançada pela Antena 2 da RDP, que adianta que a pianista se fartou “dos coices e pontapés que tem recebido do Governo português".

Decepcionada com o modo como tem sido tratada a nível governamental, sobretudo no seu projecto de ensino artístico de Belgais (Castelo Branco), Maria João Pires, que tinha dupla nacionalidade, decidiu agora ficar apenas com a brasileira.

Em Junho de 2006, Maria João Pires abandonou o Projecto Educativo de Belgais, que desenvolveu no concelho de Castelo Branco, e decidiu ir viver para o Brasil, onde pediu autorização de residência. A pianista está a viver em Salvador, no Estado da Bahia, e vai dedicar-se à hotelaria.

A decisão de renunciar à cidadania portuguesa foi revelada ontem pessoalmente pela pianista ao jornalista da Antena 2 Paulo Alves Guerra, numa conversa que os dois tiveram num centro comercial de Lisboa.

“Encontrei-a casualmente no Centro Comercial das Amoreiras. Maria João Pires andava às compras e ao ver-me acenou-me. Fui ter com ela e no desenrolar da conversa disse-me que ia renunciar à cidadania portuguesa”, relatou ao PÚBLICO o jornalista.

Paulo Alves Guerra advertiu-a de que estava a falar com um jornalista, ao que ela respondeu que podia utilizar a informação como quisesse. Só não permitiu que as suas declarações fossem gravadas.

Maria João Pires não pretenderá fazer mais declarações em Portugal. Daqui para a frente a sua vida vai passar a ser feita entre Portugal, Suíça e Brasil.

A pianista tem recebido telefonemas de vários organismos governamentais de Espanha e do Brasil a convidarem-na para se instalar definitivamente nesses países, mas o convite feito pelas autoridades brasileiras terá sido muito sedutor, levando a pianista a optar por se mudar de armas e bagagens para o outro lado do Atlântico.

Nascida a 23 de Julho de 1944, Maria João Pires aprendeu muito cedo a tocar piano: aos cinco anos deu o seu primeiro recital e aos sete anos tocou publicamente concertos de Mozart.

Com nove anos recebeu o prémio da Juventude Musical. Torna-se reconhecida internacionalmente ao vencer o concurso internacional do bicentenário de Beethoven, em 1970, realizado em Bruxelas.

Maria João Pires renunciou à cidadania portuguesa mas não aos concertos em Portugal, estando igualmente a preparar um novo disco.
Publico
Imagem: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgw7MU7q3q-bo9Ap72Ct5re3kbXLsAT-9qpYdLpZQwGF2o0f9Ys_ZZi5t4a9o52wUKPYPsUJ0NhRhlMr58VV2q_UUoi9Whmed8I2IRnQu36V1xRVFgkl8ggSO02epJwxUBO5BaRN8Ij3TI/s400/MariaJoaoPires_ChopinTheNocturnes_sm.jpg

terça-feira, 7 de julho de 2009

Fernando Namora (1919-1989)



Fernando Gonçalves Namora, de seu nome completo, era filho de António Mendes Namora e Albertina Gonçalves Namora. Nasceu em Condeixa, no dia 15 de Abril de 1919 e faleceu aos 69 anos de idade, no dia 31 de Janeiro de 1989. A infância, a juventude e a adolescência passou-as, no entanto, no nosso concelho, mais concretamente no Vale Florido (freguesia do Alvorge).
Muito do texto literário produzido, tem as marcas desse tempo em que formou a sua personalidade e granjeou os instrumentos inspirativos para uma obra monumental, que todo o mundo culto conhece e admira.
A sua obra, em termos de correntes literárias, evoluiu no sentido dum amadurecimento estético do “neo-realismo”, o que o levou a enveredar por caminho mais pessoal. Não desprezando a análise social, a sua prosa ficou marcada, sobretudo, pelos aspectos do burlesco, observações naturalistas e algum existencialismo.
O nosso biografado foi, sem dúvida, um escritor dotado de uma profunda capacidade de análise psicológica, própria de uma pessoa bem formada e muito sensível, e por isso capaz duma linguagem de grande carga poética. Escreveu poesia, romances, contos, memórias e impressões de viagem.
O poema “Terra” (que, a seguir, se transcreve) é apenas um exemplo, dos muitos que se poderiam apresentar, de alguém que viveu nestas paragens, conheceu bem as suas gentes, os seus modos de vida, os interrogou e reflectiu.



«Terra

Onde ficava o mundo?
Só pinhais, matos, charnecas e milho
para a fome dos olhos.
Para lá da serra, o azul de outra serra e outra serra ainda.
E o mar? E a cidade? E os Rios?
Caminhos de pedra, sulcados, curtos e estreitos,
onde chiam carros de bois e há poças de chuva.
Onde ficava o mundo?
Nem a alma sabia julgar.
Mas vieram engenheiros e máquinas estranhas.
Em cada dia o povo abraçava outro povo.
E hoje a terra é livre e fácil como o céu das aves:
a estrada branca e menina é uma serpente ondulada
e dela nasce a sede da fuga como as águas dum rio.»

Como outros jovens da região que estudavam frequentou o Liceu e a Universidade em Coimbra

Como alguns dos jovens de famílias mais abastadas desta região, Fernando Namora, aos 16 anos, já estava em Coimbra a estudar no Liceu José Falcão. Logo aí o jeito para a escrita se manifestou, tornando-se o Director do jornal académico Alvorada e escrevendo o seu primeiro livro, Almas sem rumo.
A partir de então, às tarefas ligadas aos estudos, juntou as de escritor e nunca mais parou.
Aos 19 anos de idade edita o seu primeiro livro de poemas, Relevos. Nesse mesmo ano, com o romance As sete partidas do mundo, ganha o prémio Almeida Garrett. A qualidade da sua escrita, ainda tão novo, é de imediato reconhecida e, ainda no mesmo ano de 1938, obtém o prémio Mestre António Augusto Gonçalves, de artes plásticas.
Dois anos mais tarde publica o livro de poemas Mar de Sargaços.
Em 1941, o seu livro de poemas “Terra” é integrado no “Novo Cancioneiro”.
No ano seguinte, Fernando Namora conclui a licenciatura em Medicina e abre consultório em Condeixa. Nesse mesmo ano, sai o romance Fogo na Noite Escura, editado pela colecção “Novos Prosadores”.
Um ano depois (1943) exerce a sua profissão de médico em Tinalhas, (Castelo Branco), onde escreverá a novela Casa da Malta (que só publicaria dois anos mais tarde). Nessa obra vêm ao de cima muitas recordações da casa de seus pais, como ele próprio confessa dois anos antes de morrer.
Efectivamente, dois anos antes do seu desaparecimento físico, o Jornal das Letras (de 5 de Janeiro de 1987) lembra a ilustre figura do nosso biografado. E o excerto, que a seguir transcrevemos, são mesmo as palavras de Fernando Namora, aos 67 anos, lembrando bem os tempos passados no nosso concelho e como influenciaram profundamente a sua obra literária.

O concelho de Ansião, e particularmente o Alvorge, pode ufanar-se do ilustre nome de Fernando Namora
«Às vezes persiste só um odor: resinas, urze, o chamuscar do porco na bárbara matança ritual…»
«(…) A adolescência melancólica, a juventude dramatizada. Mas os anos longínquos quase se me esvaziaram. Talvez tivesse precisado de os esquecer. Às vezes persiste só um odor: resinas, urze, o chamuscar do porco na bárbara matança ritual, os refugados impregnado quanta vizinhança havia, à hora da ceia – a ceia do par de velhos cujo conduto para a broa era uma cebola apurada na frigideira.
Tudo cheiros medulares e sugestivos. Às vezes um som: o vento nas ramarias, os sinos perdidos na charneca, os estalidos da madeira do tecto, o estrondo no castanheiro do fundo do quintal naquela noite de raios e coriscos, o piar nocturno de uma ave. Tudo sons que davam mistério às coisas. Às vezes uma imagem desgarrada, sobressaindo absurdamente na opacidade do tempo: uma certa viga ou uma certa fasquia do crescer vagaroso da casa dos meus pais, uma casa que era para eles um desagravo quase passional (aldeia de Vale Florido, nas bandas de Ansião, personagem de muitos dos meus poemas e de umas tantas páginas da Casa da Malta), os três moinhos no cabeço das Degracias, três exílios, três vigias sobre o mato ralo que nem às cabras metia cobiça.
Um cerro mais adiante, nos orvalhos matutinos, já havia sinais desse fabuloso “mar de água” com que a mulher adúltera da aldeia, mulher viajada, mulher sabida, nos desassossegava a imaginação, tanto como nos uivos distantes havia os pressentimentos de comboios, também eles fabulosos, salvo para os aldeões emigrantes que iam às vindimas à Bairrada. Imagens desgarradas, sim, mas imperecíveis: os formigueiros em pânico na rua da vinha, minha curiosidade insaciada, súbito um pastor e o seu cão no meu vadiar solitário, súbito a contadora de enredos nas descamisadas do estio (a arte das ficções foi ela quem primeiro mas incutiu), uma galinha degolada mas nela a morte correndo viva até à fulminação repentina junto do muro da eira (quanto o horror, qualquer horror, me queima de profunda desventura), súbito umas luvas brancas no dia da primeira comunhão e o castigo aplicado com método e deleite, por tê-las sujado de chocolate na merenda tradicionalmente oferecida pelos “Senhores do Palácio” – a vila era feudal!
… Eu passava na aldeia os meses de Verão. A bem dizer, tinha por companheiro o mestre Paulo. Não se fazia uso desse trato de “mestre”, mas depois no Alentejo, aprendi-lhe a expressiva adequação. Mestre Paulo, ele sozinho sem ajudantes, foi o obreiro, quanto a carpintarias, da tal casa de meus pais. Todo o madeirame que por lá se vê teve o afago das suas mãos, anos e anos de idas e vindas do longe onde morava até Vale Florido…
Além de mestre Paulo, a velha Florinda, já a atrás referida mas não nomeada. Chamavam-lhe a “russa”: os seus cabelos, como os da minha avó eram só neve. Sem parentela, um rebanho de quatro cabeças, nos montes baldios a ia procurar para lhe ouvir estórias de espanto. A realidade da aldeia, homens e bichos, nada eram ou eram ilusão: o real estava na fantasia de quem dela se quisesse servir. Rima a rima, Ti Florinda ensinou-me romances versejados, deu-me motes para a minha inventiva assim instigada. Fiquei sempre duvidoso da sua morte: quando menos se esperasse, ela iria repetir as ressuscitações dos seus heróis prodigiosos.
Com o tempo e o desaparecimento das pessoas acentuou-se o meu pendor para a solitude. Errava pelos montes, observando os moleiros e os pastores, decorava livros inteiros de poesia, recitando-os para mim próprio no quarto que dava para a rua da vinha».
«Também minha mãe foi, a seu modo, artista – e grande. “Pintava” belos painéis com rendas e trapos»

Numa entrevista concedida a Cunca de Almeida, em 1 de Março de 1985, Fernando Namora, a respeito dos seus tempos de Ansião, respondia assim:
«- Passei boa parte da infância e da adolescência em Vale Florido, na freguesia do Alvorge. Em “Nome para uma Casa” falo muito desses sítios, como já falara em “As Frias Madrugadas”. Eram ali as minhas férias. E no Alvorge exerceu a sua profissão de boticário um dos meus tios, Antero Mendes Namora, que foi a personagem fabulosa da minha juventude, homem de uma só peça, amante da música e da natureza, profissional de rara competência. Cada uma das suas cartas ou escritos eram peças literárias de alta craveira.
Também minha mãe foi, a seu modo, artista – e grande. “Pintava” belos painéis com rendas e trapos. Cada uma das suas colchas, de uma modernidade surpreendente, teria lugar em qualquer museu».
Como sua mãe, também Fernando Namora tinha algum jeito para as artes plásticas, embora não tenha desenvolvido grandemente esse seu dom.
Só se conhece uma única exposição individual de pintura, de Fernando Namora. Tê-la-á realizado em 1944, em Castelo Branco.
Em Outubro do mesmo ano, o Dr. Fernando Namora muda-se para Monsanto da Beira. Em 1945, publica a novela Casa da Malta.
Em 1946 passa a exercer o cargo de médico municipal de Pavia, no Alentejo. É nesse ano que publica o romance Minas de San Francisco, que no ano anterior, havia escrito em Monsanto.
Três anos mais tarde, vem a lume a primeira série da famosa e mediática obra Retalhos da Vida de um Médico, que obterá o Prémio Vértice. A adaptação desta obra a uma série televisiva e a sua edição espanhola, prefaciada por Gregório Marañon, dão-lhe projecção internacional.

Na sua obra passa em revista a nossa própria realidade humana, social e cultural

Em Retalhos da Vida de um Médico como em muitos outros textos, Fernando Namora passa em revista a nossa própria realidade humana, social e cultural. «Confronta-a com a de outros países, anotando em pormenor os aspectos que uma atenta e lúcida observação não deixa escapar: seja o quotidiano lisboeta, fixado em pormenores que sempre se ligam a um entendimento do mundo à sua volta, seja em redor das paisagens e gentes alentejanas (e muito belas se revelam as páginas de evocação de Castelo de Vide, Marvão, Portalegre ou Monsaraz), ou mesmo para falar dos problemas e questões levantadas sobre a literatura ou a crítica, enfim, a cultura no sentido mais universal, no diálogo vivo com intelectuais de outros quadrantes, o que se afirma nas páginas de Sentados na Relva é ainda (e sempre) uma visão realista de pretender dar do mundo e dos homens que se cruzam no seu caminho, no entusiasmo das ideias e das paixões mais sinceras, o retrato mais exacto e preciso nos contornos ou sentimentos que extravasam desse inalterável? discurso? literário. E por aí Fernando Namora se declara sempre implacável».

http://ansianensesilustres.blogs.sapo.pt/2035.html
Foto: Em Monsanto com a sua mulher no ano de 1945

sábado, 4 de julho de 2009

A poesia de Viriato da Cruz




"Tua presença, minha Mãe - drama vivo duma Raça, / Drama de carne e sangue / Que a Vida escreveu com a pena dos séculos! / Pela tua voz / Vozes vindas dos canaviais dos arrozais dos cafezais dos seringais dos algodoais!... / Vozes das plantações de Virgínia / dos campos das Carolinas / Alabama / Cuba / Brasil..."

Biografia

Porto Amboim, Angola, 1928 - Pequim, China, 1973. Foi um dos mentores do Movimento dos Novos Intelectuais de Angola (1948) e da revista Mensagem (1951-1952). Foi membro-fundador e secretário-geral do MPLA. Dissidente deste movimento, esteve exilado em Portugal e noutros países europeus, fixando-se posteriormente na China. Teve grande importância no desenvolvimento da literatura angolana, caracterizando-se a sua obra pelo apego a certos valores africanos, quer quanto à temática, quer quanto à forma. A sua produção está dispersa por publicações periódicas e representada em várias antologias, das quais uma - No Reino de Caliban - reúne a sua obra poética.
Obra Poética:

Poemas, 1961, Lisboa, Casa dos Estudantes do Império.

Mamã negra
(canto da esperança)

(À memória do poeta haitiano Jacques Roumain)

Tua presença, minha Mãe - drama vivo duma Raça,
Drama de carne e sangue
Que a Vida escreveu com a pena dos séculos!

Pela tua voz
Vozes vindas dos canaviais dos arrozais dos cafezais
[dos seringais dos algodoais!...
Vozes das plantações de Virgínia
dos campos das Carolinas
Alabama
Cuba
Brasil...
Vozes dos engenhos dos bangüês das tongas dos eitos
[das pampas das minas!
Vozes de Harlem Hill District South
vozes das sanzalas!
Vozes gemendo blues, subindo do Mississipi, ecoando
[dos vagões!
Vozes chorando na voz de Corrothers:
Lord God, what will have we done
- Vozes de toda América! Vozes de toda África!
Voz de todas as vozes, na voz altiva de Langston
Na bela voz de Guillén...

Pelo teu dorso
Rebrilhantes dorsos aso sóis mais fortes do mundo!
Rebrilhantes dorsos, fecundando com sangue, com suor
[amaciando as mais ricas terras do mundo!
Rebrilhantes dorsos (ai, a cor desses dorsos...)
Rebrilhantes dorsos torcidos no "tronco", pendentes da
[forca, caídos por Lynch!
Rebrilhantes dorsos (Ah, como brilham esses dorsos!)
ressuscitados em Zumbi, em Toussaint alevantados!
Rebrilhantes dorsos...
brilhem, brilhem, batedores de jazz
rebentem, rebentem, grilhetas da Alma
evade-te, ó Alma, nas asas da Música!
...do brilho do Sol, do Sol fecundo
imortal
e belo...

Pelo teu regaço, minha Mãe,
Outras gentes embaladas
à voz da ternura ninadas
do teu leite alimentadas
de bondade e poesia
de música ritmo e graça...
santos poetas e sábios...

Outras gentes... não teus filhos,
que estes nascendo alimárias
semoventes, coisas várias,
mais são filhos da desgraça:
a enxada é o seu brinquedo
trabalho escravo - folguedo...

Pelos teus olhos, minha Mãe
Vejo oceanos de dor
Claridades de sol-posto, paisagens
Roxas paisagens
Dramas de Cam e Jafé...
Mas vejo (Oh! se vejo!...)
mas vejo também que a luz roubada aos teus
[olhos, ora esplende
demoniacamente tentadora - como a Certeza...
cintilantemente firme - como a Esperança...
em nós outros, teus filhos,
gerando, formando, anunciando -

o dia da humanidade

O DIA DA HUMANIDADE!...

(No reino de Caliban II - antologia
panorâmica de poesia africana de ex-
pressão portuguesa)

Rimance da menina da roça
A menina da roça
está no terreiro
cosendo a toalhinha
pró seu enxoval...
- “ Que céu tão lindo!,
e o encanto da mata!...
Ai, tanta beleza
no cafezal...”

A menina da roça terá poesia
terá poesia nos olhos de mel?

A menina da roça
chega à janela
e na estrada branca
a vista alonga...
- “É o carro a vir?”
Não... é o bater compassado
do aço de enxadas
dos negros na tonga...

A menina da roça tem é um namoro
tem um namoro com um motorista

A menina da roça
veio à varanda
e os olhos erra
no verde à toa
- “Está ele a chegar?!”
Ah... são negros pilando
dendém para azeite
na grande canoa

(Prucutum, lá do telheiro,
vai chamar o meu amor)

A menina da roça
acorda à noite
ouviu um barulho
na escuridão
- “O carro chegou!...”
Oh... é o pulsar
apressado
do seu coração

(Por que bates tão depressa, coração alucinado?
Coração alucinado, espera que o dia amanheça)

- “Já viu a minina?...”
“Hem... tem cor marela
do mburututu...”
- “E não come nem nada...”
- “E os olhos de mel
tão-se afundar
num lago azul
que faz sonhar...”
Conversam as negras
à boca apertada

(minha dor, ninguém a saiba –
não há peito em que ela caiba)

A menina da roça
escuta dorida
a triste canção
que vem do rio

Que vem do rio? – Que vem do peito:
baixinho, lá dentro,
chora de amor
o coração.

Menina da roça – águas do rio
saudades da fonte... desejos de amar.

(No reino de Caliban II - antologia
panorâmica de poesia africana de ex-
pressão portuguesa)

Serão de menino
Na noite morna, escura de breu,
enquanto na vasta sanzala do céu,
de volta de estrelas, quais fogaréus,
os anjos escutam parábolas de santos...

na noite de breu
ao quente da voz
de suas avós,
meninos se encantam
de contos bantos...

"Era uma vez uma corça
dona de cabra sem macho...
.........................................
... Matreiro, o cágado lento
tuc... tuc... foi entrando
para o conselho animal...
("- Tão tarde que ele chegou!")
Abriu a boca e falou -
deu a sentença final:
"- Não tenham medo da força!
Se o leão o alheio retém
- luta ao Mal! Vitória ao Bem!
tire-se ao leão, dê-se à corça."

Mas quando lá fora
o vento irado nas fresta chora
e ramos xuaxalha de altas mulembas
e portas bambas batem em massembas
os meninos se apertam de olhos abertos:

- Eué
- É casumbi...

E a gente grande -
bem perto dali
feijão descascando para o quitande-
a gente grande com gosto ri...

Com gosto ri, porque ela diz
que o casumbi males só faz
a quem não tem amor, aos mais
seres buscam, em negra noite,
essa outra voz de casumbi
essa outra voz - Felicidade...

(No reino de Caliban II - antologia
panorâmica de poesia africana de ex-
pressão portuguesa)

Makèsú
- "Kuakié!... Makèzú..."
...............................................
O pregão da avó Ximinha
É mesmo como os seus panos
Já não tem a cor berrante
Que tinha nos outros anos.

Avó Xima está velhinha
Mas de manhã, manhãzinha,
Pede licença ao reumático
E num passo nada prático
Rasga estradinhas na areia...

Lá vai para um cajueiro
Que se levanta altaneiro
No cruzeiro dos caminhos
Das gentes que vão p´ra Baixa.

Nem criados, nem pedreiros
Nem alegres lavadeiras
Dessa nova geração
Das "venidas de alcatrão"
Ouvem o fraco pregão
Da velhinha quitandeira.

- "Kuakié!... Makèzú, Makèzú..."
- "Antão, véia, hoje nada?"
- "Nada, mano Filisberto...
Hoje os tempo tá mudado..."

- "Mas tá passá gente perto...
Como é aqui tá fazendo isso?"

- "Não sabe?! Todo esse povo
Pegô num costume novo
Qui diz qué civrização:
Come só pão com chouriço
Ou toma café com pão...

E diz ainda pru cima
(Hum... mbundu Kene muxima...)
Qui o nosso bom makèzú
É pra véios como tu."

- "Eles não sabe o que diz...
Pru qué Qui vivi filiz
E tem cem ano eu e tu?"

- "É pruquê nossas raiz
Tem força do makèzú!..."

(No reino de Caliban II - antologia
panorâmica de poesia africana de ex-
pressão portuguesa)

Sô Santo
Lá vai o sô Santo...
Bengala na mão
Grande corrente de ouro, que sai da lapela
Ao bolso... que não tem um tostão.

Quando sô Santo passa
Gente e mais gente vem à janela:
- "Bom dia, padrinho..."
- "Olá!..."
- "Beçá cumpadre..."
- "Como está?..."
- "Bom-om di-ia sô Saaanto!..."
- "Olá, Povo!..."

Mas por que é saudado em coro?
Porque tem muitos afilhados?
Porque tem corrente de ouro
A enfeitar sua pobreza?...
Não me responde, avó Naxa?

- "Sô Santo teve riqueza...
Dono de musseques e mais musseques...
Padrinho de moleques e mais moleques...
Macho de amantes e mais amantes,
Beça-nganas bonitas
Que cantam pelas rebitas:

'Muari-ngana Santo
dim-dom
ualó banda ó calaçala
dim-dom
chaluto mu muzumbo
dim-dom...'

Sô Santo...

Banquetes p´ra gentes desconhecidas
Noivado da filha durando semanas
Kitoto e batuque pró povo cá fora
Champanha, ngaieta tocando lá dentro...
Garganta cansado:

'coma e arrebenta
e o que sobra vai no mar...'

Hum-hum
Mas deixa...
Quando Sô Santo morrer,
Vamos chamar um Kimbanda
Para ngombo nos dizer
Se a sua grande desgraça
Foi desamparo de Sandu
Ou se é já própria da Raça..."

Lá vai...
descendo a calçada
A mesma calçada que outrora subias
Cigarro apagado
Bengala na mão...

... Se ele é o símbolo da Raça
ou a vingança de Sandu...

(No reino de Caliban II - antologia
panorâmica de poesia africana de ex-
pressão portuguesa)

Namoro
Mandei-lhe uma carta em papel perfumado
e com a letra bonita eu disse ela tinha
um sorrir luminoso tão quente e gaiato
como o sol de Novembro brincando de artista nas acácias floridas
espalhando diamantes na fímbria do mar
e dando calor ao sumo das mangas.
sua pele macia - era sumaúma...
Sua pele macia, da cor do jambo, cheirando a rosas
tão rijo e tão doce - como o maboque...
Seu seios laranjas - laranjas do Loge
seus dentes... - marfim...

Mandei-lhe uma carta
e ela disse que não.

Mandei-lhe um cartão
que o Maninjo tipografou:
"Por ti sofre o meu coração"
Num canto - SIM, noutro canto - NÃO

E ela o canto do NÃO dobrou.

Mandei-lhe um recado pela Zefa do Sete
pedindo rogando de joelhos no chão
pela Senhora do Cabo, pela Santa Ifigénia,
me desse a ventura do seu namoro...
E ela disse que não.

Levei à avó Chica, quimbanda de fama
a areia da marca que o seu pé deixou
para que fizesse um feitiço forte e seguro
que nela nascesse um amor como o meu...
E o feitiço falhou.

Esperei-a de tarde, à porta da fábrica,
ofertei-lhe um colar e um anel e um broche,
paguei-lhe doces na calçada da Missão,
ficamos num banco do largo da Estátua,
afaguei-lhe as mãos...
falei-lhe de amor... e ela disse que não.

Andei barbado, sujo, e descalço,
como um mona-ngamba.
Procuraram por mim
" - Não viu...(ai, não viu...?) Não viu Benjamim?"
E perdido me deram no morro da Samba.

E para me distrair
levaram-me ao baile do sô Januário
mas ela lá estava num canto a rir
contando o meu caso às moças mais lindas do Bairro Operário

Tocaram uma rumba dancei com ela
e num passo maluco voamos na sala
qual uma estrela riscando o céu!
E a malta gritou: "Aí Benjamim!"
Olhei-a nos olhos - sorriu para mim
pedi-lhe um beijo - e ela disse que sim.

(No reino de Caliban II - antologia
panorâmica de poesia africana de ex-
pressão portuguesa)

http://betogomes.sites.uol.com.br/ViriatodaCruz.htm
Imagem: http://2.bp.blogspot.com/_PpE-rP0YJJM/R0cDqOsYeWI/AAAAAAAAD1U/eAfExksmvbk/s320/viriatro.jpg

sexta-feira, 3 de julho de 2009

História de Lawrence da Arábia ganha novas reviravoltas


«Terça, 28 de maio de 2002, 20h27
O mistério que rodeia a vida do enigmático inglês conhecido como Lawrence da Arábia aumentou na terça-feira com a divulgação de arquivos secretos que revelam a relação dele com uma mulher, da qual nunca se havia ouvido falar.

Thomas Edward Lawrence foi imortalizado em um longa-metragem de 1962 protagonizado por Peter O'Toole, que descreve suas façanhas como líder da revolta árabe contra os turcos durante a Primeira Guerra Mundial, em uma campanha que ajudou a causa da Grã-Bretanha.

Os documentos revelados pela Agência de Registro Público em Londres relatam a última parte da vida de Lawrence depois de seu regresso à Inglaterra.

Os arquivos também revelam um intrigante novo nome na vida de um dos ingleses mais famosos do século 20, que não aparece em dezenas de relatos existentes de suas aventuras.

Um "acordo de pagamento voluntário" que data de 1926 mostra Lawrence, conhecido na época pelo pseudônimo T.E. Shaw, cancelando um débito diário de uma mesada de 24 centavos de libra à senhorita Ruby Bryant.

Há poucos detalhes acerca da misteriosa mulher de Newark, no norte da Inglaterra. A quantidade paga a ela representava dois terços do salário de Lawrence como um humilde sub-oficial da Força Aérea Real.

Mas ela sabia claramente a verdadeira identidade dele, como mostrava sua nota ao ministério de Aire: "Amavelmente revelo que a assinatura que me fez em nome do coronel Lawrence não tem chegado a minhas mãos. Esta deveria haver chegado na quinta-feira", diz.

SEGUNDO NOVO NOME
No mesmo dia em que o pagamento foi cancelado, Lawrence ordenou um novo acordo do gênero - seis pennies diários - a W.J. Ross em Londres.

Um terceiro pagamento de três pennies por dia foi feito por Lawrence a um jovem escocês, John Bruce, de 1933 até o licenciamento de Lawrence à Força Aérea Real em 1935.

A relação entre Lawrence e Bruce já foi o centro de especulações durante anos. Alguns biógrafos alegam que isso reforçaria o argumento de que Lawrence era homossexual, ainda que tal alegação não tenha sido provada.

Lawrence morreu em 1935 em um acidente de motocicleta. Winston Churchill o chamou de "um dos maiores seres do nosso tempo" durante seu funeral.»

http://www.terra.com.br/diversao/2002/05/28/007.htm

Imagem: http://thecia.com.au/reviews/l/images/lawrence-of-arabia-18.jpg

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Viriato Clemente da Cruz


Os chineses começaram a ver que Viriato se distanciava cada vez mais das teses maoístas e mantiveram-no como refém.

Origem: WIKIPEDIA, a enciclopédia livre.

Viriato Francisco Clemente da Cruz (Kikuvo (Porto Amboim), 1928 - Pequim (China), 13 de Junho de 1973). Foi considerado um dos mais importantes impulsionadores de uma poesia regionalista angolana, nas décadas de 40 e 50, e um dos lideres da luta pela libertação de Angola.]


Contexto Histórico
Nos inícios do século XX vários países Europeus dirigiam o destino de África. Dividida e explorada entre os senhores colonialistas, sob o pretexto de "missão civilizadora" e "educacional", estes exerciam a sua máxima influência politica e cultural. Portugal não era excepção, em S.Tomé e Príncipe, Cabo Verde, Guiné, Angola e Moçambique, exerciam a sua presença (assim como nalgumas possessões na Ásia).

A literatura angolana começará a florescer ainda no século XIX (considerando o ano do seu nascimento em 1860, com grande influência do romantismo português). Essa literatura modificar-se-á a partir da segunda guerra mundial, irá então buscar a sua influência à literatura brasileira.

A partir de 1945 toda situação politica modifica-se, surgirão por todos os países africanos diversos movimentos de libertação, eram os ventos da mudança que assolavam toda a velha cultura europeia.

Actividade Política
Viriato fez os estudos liceais em Luanda,no liceu Salvador Correia (durante anos, centro do intelectualismo angolano), as dificuldades financeiras derivadas da ausência do pai (que cedo abandonou a família) causaram uma vida de dificuldades que o fizeram abrir os olhos à ideologia marxista. Abandonou Angola por volta de 1957 para se dirigir a Paris onde se encontrou com Mário Pinto de Andrade, desenvolvendo uma intensa actividade política e cultural.

Na década de 60 tornou-se Secretário-Geral do MPLA – Movimento Popular de Libertação de Angola, partido esse que ajudou a fundar, juntamente com Mário Pinto de Andrade. Mais tarde dissabores com agostinho Neto irão obriga-lo a abandonar o partido; Neto defendia um comunismo soviético, e Viriato, um comunismo maoista.

Exilado na China
Vai para Pequim, na década de setenta, os dirigentes chineses recebem-no de braços abertos, pois tinha demonstrado uma enorme capacidade na criação do MPLA, primeiro em Conackry e, depois, no Congo Belga (neste foi detido e sofreu torturas, por defender ideias contrárias às estabelecidas). Os chineses entendiam que Viriato da Cruz poderia facilitar a penetração ideológica do socialismo maoísta no continente africano - o que não sabiam era que estavam profundamente enganados; daí nasceu um grave mal-entendido com consequências trágicas para Viriato e para a sua família.

Elabora um relatório onde afirma que os países Africanos, mesmo os mais desenvolvidos, não estão preparados para uma revolução socialista. Demonstra então grande firmeza ao recusar-se a mudar o relatório. Esse aspectos do seu carácter já lhe tinha valido graves dissabores na sua curta vida política quando da crise de 1962-63, no seio do MPLA. O relatório pessimista elaborado por Viriato ia contra a doutrina maoísta da iminência da revolução mundial.

Os chineses começaram a ver que Viriato se distanciava cada vez mais das teses maoístas e mantiveram-no como refém. Ele não entendia porque não o expulsavam. Mas os Chineses temiam a inteligência superior de Viriato e as consequências negativas que ele poderia causar à causa maoísta se saísse da China.

Últimos anos de vida
Os últimos anos de vida de Viriato foram marcados por falta de alimentos, colidindo na fome que acabou por fragilizá-lo. Veio a falecer no dia 13 de Junho de 1973. No entanto, a derradeira humilhação foi a maneira abjecta como foi levado para o cemitério dos estrangeiros: entaipado entre quatro tábuas, transportado num camião militar.

Principais obras
Poemas (1961). Entre os seus textos poéticos, destacam-se Namoro, Sô Santo e Makézu

Imagem: http://fotocache01.stormap.sapo.pt/fotostore01/fotos//b7/e0/b3/1787593_SlmP4.jpeg

quarta-feira, 1 de julho de 2009

José Saramago


Origem: WIKIPEDIA a enciclopédia livre.

Nascimento 16 de Novembro de 1922 (86 anos)
Nacionalidade portuguesa. Ocupação Escritor, poeta. Principais trabalhos Memorial do Convento; O Evangelho Segundo Jesus Cristo'; Ensaio Sobre a Cegueira...
Página oficial: http://www.josesaramago.org


José de Sousa Saramago (Azinhaga, 16 de Novembro de 1922) é um escritor, roteirista, jornalista, dramaturgo e poeta português, galardoado em 1998 com o Nobel da Literatura. Também ganhou o Prémio Camões, o mais importante prémio literário da língua portuguesa. Saramago é considerado o responsável pelo efetivo reconhecimento internacional da prosa em língua portuguesa.[1]

O seu livro Ensaio sobre a Cegueira (Blindness, em inglês) foi adaptado para o cinema e lançado em 2008, produzido no Japão, Brasil e Canadá, dirigido por Fernando Meirelles(realizador de O jardineiro fiel e Cidade de Deus).

Nasceu na província do Ribatejo, no dia 16 de novembro, embora o registo oficial apresente o dia 18 como o do seu nascimento. Saramago, conhecido pelo seu ateísmo e iberismo, é membro do Partido Comunista Português e foi director do Diário de Notícias. Juntamente com Luiz Francisco Rebello, Armindo Magalhães, Manuel da Fonseca e Urbano Tavares Rodrigues foi, em 1992, um dos fundadores da Frente Nacional para a Defesa da Cultura (FNDC). Casado com a espanhola Pilar del Río, Saramago vive actualmente em Lanzarote, nas Ilhas Canárias.

Biografia
Saramago nasceu numa aldeia do Ribatejo, chamada Azinhaga, de uma família de pais e avós pobres. A vida simples, transcorrida em grande parte em Lisboa, para onde a família se muda em 1924 – era um menino de apenas 2 anos de idade – impede-o de ingressar em uma universidade, apesar do gosto que demonstra desde cedo pelos estudos. Para garantir o seu sustento, formou-se em uma escola técnica. Seu primeiro emprego foi serralheiro mecânico. Entretanto, fascinado pelos livros, à noite visitava com grande frequência a Biblioteca Municipal Central - Palácio Galveias na capital portuguesa.

José Saramago no Festival Internacional de Filmes de San Sebastián (segurando a tradução em língua persa de seu livro Ensaio sobre a cegueira.

Autodidata, aos 25 anos publica o primeiro romance Terra do pecado (1947), mesmo ano de nascimento de sua filha, Violante, fruto do primeiro casamento com Ilda Reis – com quem se casou em 1944 e permaneceu até 1970 - nessa época, Saramago era funcionário público; em 1988, se casaria com a jornalista e tradutora espanhola María del Pilar del Río Sánchez, que conheceu em 1986, ao lado da qual continua a viver. Em 1955, começa a fazer traduções para aumentar os rendimentos – Hegel, Tolstói e Baudelaire, entre outros autores a quem se dedica.

Depois de Terra do Pecado, Saramago apresenta a seu editor o livro Clarabóia, que, rejeitado, permanece inédito até hoje. Saramago persiste nos esforços literários e, 19 anos depois – então funcionário da Editorial Estudos Cor - troca a prosa pela poesia e lança Os poemas possíveis. Em um espaço de cinco anos, depois, publica sem alarde mais dois livros de poesia, Provavelmente alegria (1970) e O ano de 1993 (1975). É quando troca também de emprego, abandonando a Estudos Cor para ingressar nos jornais Diário de Notícias, depois no Diário de Lisboa. Em 1975, retorna ao Diário de Notícias como diretor-adjunto, onde permanece por dez meses, até 25 de novembro do mesmo ano, quando os militares portugueses intervêm na publicação (reagindo ao que consideravam os excessos da Revolução dos Cravos) demitindo vários funcionários. Demitido, Saramago resolve dedicar-se apenas à literatura, substituindo de vez o jornalista pelo ficcionista: “(...) Estava a espera de que as pedras do puzzle do destino – supondo-se que haja destino, não creio que haja – se organizassem. É preciso que cada um de nós ponha a sua própria pedra, e a que eu pus foi esta: “Não vou procurar trabalho”, disse Saramago em entrevista à revista Playboy, em 1988[2].

Da experiência vivida nos jornais, restaram quatro crônicas: Deste mundo e do outro, 1971, A bagagem do viajante, 1973, As opiniões que o DL teve, 1974 e Os apontamentos, 1976. Mas, não são as crônicas, nem os contos, nem o teatro os responsáveis por fazer de Saramago um dos autores portugueses de maior destaque - missão reservada a seus romances, gênero a que retorna em 1977.

Três décadas depois de publicado Terra do pecado, Saramago retorna ao mundo da prosa ficcional com Manual de pintura e caligrafia. Mas, ainda não foi aí que o autor definiu o seu estilo. As marcas características do estilo saramaguiano só apareceriam com Levantado do chão (1980), livro no qual o autor retrata a vida de privações da população pobre do Alentejo.

Dois anos depois de Levantado do chão (1982) surge Memorial do convento, livro que conquista definitivamente a atenção de leitores e críticos. Nele, Saramago mistura fatos reais com personagens inventados: o rei D. João V e Bartolomeu de Gusmão, com a misteriosa D. Blimunda e o operário Baltazar, por exemplo.

De 1980 a 1991, o autor traz a lume mais quatro romances que remetem a fatos da realidade material, problematizando a interpretação da "história" oficial: O ano da morte de Ricardo Reis (1984) - sobre as andanças do heterônimo de Fernando Pessoa por Lisboa; A jangada de pedra (1986) - quando a Península Ibérica solta-se do resto da Europa e navega pelo Atlântico; História do cerco de Lisboa (1989) - onde um revisor é tentado a introduzir um "não" no texto histórico que corrige, mudando-lhe o sentido; e O Evangelho segundo Jesus Cristo (1991) - onde Saramago reescreve o livro sagrado sob a ótica de um Cristo humanizado (sua obra mais controvertida).

Nos anos seguintes, entre 1995 e 2005, Saramago publicará mais seis romances, dando início a uma nova fase em que os enredos não se desenrolam mais em locais ou épocas determinados e personagens dos anais da história se ausentam: Ensaio sobre a cegueira (1995); Todos os nomes (1997); A caverna (2001); O homem duplicado (2002); Ensaio sobre a lucidez (2004); e As intermitências da morte (2005). Nessa fase, Saramago penetra de maneira mais investigativa os caminhos da sociedade contemporânea.

[
Obra
Dificílimo acto é o de escrever, responsabilidade das maiores.(...) Basta pensar no extenuante trabalho que será dispor por ordem temporal os acontecimentos, primeiro este, depois aquele, ou, se tal mais convém às necessidades do efeito, o sucesso de hoje posto antes do episódio de ontem, e outras não menos arriscadas acrobacias(...)
Saramago, A jangada de pedra, 1986


Saramago é conhecido por utilizar frases e períodos compridos, usando a pontuação de uma maneira não convencional. Os diálogos das personagens são inseridos nos próprios parágrafos que os antecedem, de forma que não existem travessões nos seus livros: este tipo de marcação das falas propicia uma forte sensação de fluxo de consciência, a ponto do leitor chegar a confundir-se se um certo diálogo foi real ou apenas um pensamento. Muitas das suas frases (i.e. orações) ocupam mais de uma página, usando vírgulas onde a maioria dos escritores usaria pontos finais. Da mesma forma, muitos dos seus parágrafos ocupariam capítulos inteiros de outros autores. Apesar disso o seu estilo não torna a leitura mais difícil, os seus leitores habituam-se facilmente ao seu ritmo próprio.

Estas características tornam o estilo de Saramago único na literatura contemporânea: é considerado por muitos críticos um mestre no tratamento da língua portuguesa. Em 2003, o crítico norte-americano Harold Bloom, em seu livro Genius: A Mosaic of One Hundred Exemplary Creative Minds ("Génio: um mosaico de cem mentes criativas exemplares"), considerou José Saramago "o mais talentoso romancista vivo nos dias de hoje" (tradução livre de the most gifted novelist alive in the world today), referindo-se a ele como "o Mestre". Declarou ainda que Saramago é "um dos últimos titãs de um género literário que se está desvanecendo".

Obras publicadas
Romances
Terra do pecado, 1947
Manual de pintura e caligrafia, 1977
Levantado do chão, 1980
Memorial do convento, 1982
O ano da morte de Ricardo Reis, 1984
A jangada de pedra, 1986
História do cerco de Lisboa, 1989
O Evangelho segundo Jesus Cristo, 1991
Ensaio sobre a cegueira, 1995
A bagagem do viajante, 1996
Cadernos de Lanzarote, 1994
Todos os nomes, 1997
A caverna, 2000
O homem duplicado, 2002
Ensaio sobre a lucidez, 2004
As intermitências da morte, 2005
As pequenas memórias, 2006
A Viagem do Elefante, 2008 Peças teatrais
A noite
Que farei com este livro?
A segunda vida de Francisco de Assis
In Nomine Dei
Don Giovanni ou O dissoluto absolvido Contos
Objecto quase, 1978
Poética dos cinco sentidos - O ouvido, 1979
O conto da ilha desconhecida, 1997
Poemas
Os poemas possíveis, 1966
Provavelmente alegria, 1970
O ano de 1993, 1975 Crônicas
Deste mundo e do outro, 1971
A bagagem do viajante, 1973
As opiniões que o DL teve, 1974
Os apontamentos, 1977 Viagens
Viagem a Portugal, 1981
Infantil
A Maior Flor do Mundo, 2001


Premiações
Dentre as premiações destacam-se o Prêmio Camões (1995) - distinção máxima oferecida aos escritores de língua portuguesa; o Prêmio Nobel de Literatura (1998) - o primeiro concedido a um escritor de língua portuguesa.

Polémicas"Marx nunca teve tanta razão como hoje."[3]
José Saramago, Público, 15/06/2008
A carreira de Saramago tem sido acompanhada de diversas polémicas. As suas opiniões pessoais sobre religião ou sobre a luta internacional contra o terrorismo são discutidas e algumas resultam mesmo em acusações de diversos quadrantes. Logo após a atribuição do Prémio Nobel, o Vaticano repudiava a atribuição da honraria a um "comunista inveterado".

O livro "O Evangelho Segundo Jesus Cristo" foi adaptado para o teatro em 2001. A peça foi motivo de crítica ferrenha por parte de grupos religiosos que consideram a obra uma ofensa à Igreja.

Críticas a Israel e acusações de anti-semitismo
Um caso que tem tido alguma repercussão relaciona-se com a posição crítica do autor em relação à posição de Israel no conflito contra os palestinianos. Por exemplo, a 13 de Outubro de 2003, numa visita a São Paulo, em entrevista ao jornal O Globo, afirmou que os Judeus não merecem a simpatia pelo sofrimento por que passaram durante o Holocausto... Vivendo sob as trevas do Holocausto e esperando ser perdoados por tudo o que fazem em nome do que eles sofreram parece-me ser abusivo. Eles não aprenderam nada com o sofrimento dos seus pais e avós. A Anti-Defamation League (ADL) (Liga Anti-Difamação), um grupo judaico de defesa dos direitos civis, caracterizou estes comentários como sendo anti-semitas. Segundo as palavras de Abraham Foxman, director da ADL, "os comentários de José Saramago são incendiários, profundamente ofensivos e mostram uma ignorância destes assuntos, o que sugere um preconceito contra os Judeus".

Em defesa de Saramago, diversos autores afirmam que ele não se insurge contra os judeus, mas contra a política de Israel, como, por exemplo, num artigo publicado a 3 de Maio de 2002 no jornal Público, onde, comparando o actual conflito com a cena bíblica de David e Golias, o autor diz que David, representando Israel, "se tornou num novo Golias" e que aquele "lírico David que cantava loas a Betsabé, encarnado agora na figura gargantuesca de um criminoso de guerra chamado Ariel Sharon, lança a "poética" mensagem de que primeiro é necessário esmagar os palestinos para depois negociar com o que deles restar".

Integração de Portugal numa Federação Ibérica
Em entrevista ao jornal Diário de Notícias em 15 de Julho de 2007, Saramago afirmou que a integração entre Espanha e Portugal é uma forte probabilidade e que os portugueses só teriam a ganhar se Portugal fosse integrado na Espanha, país no qual se auto-exilou (na ilha de Lanzarote) e que viu como seu a atribuição do Nobel da Literatura. [1].

A ida para Lanzarote conta mais sobre o escritor do que deixa transparecer a justificativa corrente (a medida censória portuguesa). Com o gesto de afastamento rumo à ilha mais oriental das Canárias, Saramago não apenas protesta ante o cerceamento, como finca raízes num local de geografia inóspita (trata-se de uma ilha vulcânica, com pouca vegetação e nenhuma fonte de água potável). A decisão tem um caráter revelador, tanto mais se se levar em conta que, neste caso, “mais oriental” significa dizer mais próximo de Portugal e do continente europeu.

Mesmo em dias de hegemonia do pensamento pró-mercado, Saramago guarda um olhar abrigado em uma ilha européia mais próxima da África que do velho centro da civilização capitalista. Sempre atento às injustiças da era moderna, vigilante das mais diversas causas sociais, Saramago não se cansa de investir, usando a arma que lhe coube usar, a palavra. “Aqui na Terra a fome continua, / A miséria, o luto, e outra vez a fome.”, diz o eu lírico do poema saramaguiano “Fala do velho do Restelo ao astronauta” (do livro Os poemas possíveis, editado em 1966).

Cronologia da atribuição de um prémio Nobel
Setembro de 1997 - A agência publicitária sueca, Jerry Bergström AB, de Estocolmo, contratada pelo ICEP - (orgão estatal português para a promoção do comércio e turismo nacional), organizou uma visita de José Saramago a Estocolmo, incluindo:
Um seminário na Hedengrens, a principal cadeia de livrarias sueca
Discurso na Universidade de Estocolmo
Várias entrevistas a jornais, revistas e rádios suecas
Nesses mesmos dias, a televisão estatal sueca produziu um programa especial dedicado a Saramago
Outubro de 1997 - A Feira Internacional do Livro de Frankfurt tem neste ano Portugal como país em destaque
10 de Dezembro de 1998 - Saramago recebe o Prémio Nobel em Estocolmo

Segundo o "Diário de Notícias", o director da empresa sueca Jerry Bergström AB afirmou: "Portugal nunca tinha tido um Prêmio Nobel e uma parte de nossa missão consistia em mudar essa situação".

Comentando esta atribuição, Sture Allén, então secretário da Academia Sueca, negou que a decisão tenha sido afectada por "campanhas publicitárias, comentários de académicos ou escritores, ou qualquer outro tipo de pressão".

Contradizendo Allén, Knut Ahnlund e Lars Gyllensten, membros da academia afirmaram que seria ridículo afirmar que os membros da academia sejam "imunes a agências publicitárias".

Segundo o Dagens Nyheter haveria provas de que uma campanha semelhante foi organizada pela Alemanha.

Knut Ahnlund, membro da academia sueca, foi crítico da atribuição do prémio Nobel a Saramago, que segundo ele foi o culminar de uma campanha profissional de relações públicas.