quarta-feira, 15 de abril de 2009

Edgar Allan Poe revisitado


Sete autores reinventam os contos do autor
O livro inclui também ilustrações de Harry Clarke

Joana Rei Madride

Quando se trata de falar de Edgar Allan Poe, as palavras começam a ficarem curtas. Pai da novela negra e da ficção científica, génio da história policial e de terror, a sua marca na literatura é profunda e inegável. No ano em que se celebra o bicentenário do seu nascimento, as editoras apressam-se em sacar as obras que renderam homenagem ao seu talento. A mais recente apresentou-se ontem, em Madride, e recolhe sete dos seus contos em sete novas versões.

'Poe', da editora 451 editores, é um reinvento dalguns dos contos do autor. "As versões que mais gosto são as que destronam o original, as que o fazem em pedaços e recreiam, a partir das suas cinzas, um monstro novo. Este foi o repto que propusemos a s escritores", conta Fernando Marías, o editor.

Eugenia Rico e Luis Alberto de Cuenca foram dois dos autores que aceitaram o repto. Ele reconstruiu 'O Corvo' e ela 'O Gato Negro', duas das obras mais emblemáticas de Poe. "Dei-me conta de que me fascino pela dobragem, pelo espelho, assim que quis reinventar o conto a partir dos olhos da mulher, morta e emparedada", recorda Eugenia Rico. E, assim, o gato converteu-se em gata. Una gata negra que fala de "uma história de maus-tratos, de uma mulher que sofre e que não acredita que o homem a quem ama se está transformando num monstro".
"Intentei sentir o que sentiu Poe ao escrevê-lo, o que é muito difícil"

A versão de 'O Corvo' de Luis Alberto de Cuenca é mais pessoal: "Intentei sentir o que sentiu Poe ao escrevê-lo, o que é muito difícil. Mas na hora a ausência da amada morta e o meu primeiro amor morreu num acidente de carro. Assim que não tive que fazer nada mais que rememorar, destruir o modelo e voltar a construí-lo", explica o autor.

Os dois escritores unem-se a Mario Cuenca Sandoval, com 'O coração delator'; Espido Freire com 'Ligeia'; José Luis de Juan con 'A queda da casa Usher'; Montero Glez con 'O mistério de Marie Rôget' e a Pablo de Santis com 'A carta roubada' para dar vida a este novo 'Poe'.

Escritor de pesadelos

Em comum, têm a admiração por um autor que marcou o seu percurso como leitores e escritores. "Poe formou-nos a todos, aos bons, aos maus, ele foi o grande magma", diz Eugenia Rico.

O livro é a soma da visão única de cada autor sobre a obra de Allan Poe. Dos seus monstros, dos seus imaginários e, sobretudo, dos seus pesadelos. "Há muitas maneiras de matar um homem. Uma delas é não deixá-lo dormir. Estou convencida de que não morre por cansaço, mas porque não pode sonhar. Isto é o que é a arte. Mas Poe é distinto. Poe tem pesadelos, a sua literatura é uma espécie de catarse", explica Eugenia Rico.
"Os livros de Poe são pesadelos comuns à humanidade, que ele tem as brânquias de contar"

Luis Alberto de Cuenca segue a mesma linha de pensamento, uma sensação que se lhe entranhou no espírito quando leu 'O Barril do amontillado'. "Foi o primeiro livro de Poe que leu, uma edição de 1859, e sentiu que tudo o que lia já o tinha sonhado. Os livros de Poe são pesadelos comuns à humanidade, que ele tem as brânquias de contar", diz.

"A própria vida de Poe era um pesadelo. Não há nenhuma história feliz na sua obra. Era um homem atormentado, alcoólico e viciado em drogas, um ser autodestrutivo. Por isso escrevia como escrevia", continua Fernando Marías.

A edição de 'Poe' completa-se com os desenhos de Harry Clarke, ilustrações que acompanham cada conto e que dão razão a todos os que os intitulam de pesadelos. Duzentos anos depois do seu nascimento, 'Poe' é uma mirada mais ao universo negro do escritor norte-americano, outro regalo para os seus seguidores, para que possam seguir submergindo-se nesses pesadelos dos quais não querem despertar.

EL MUNDO

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