segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

BAI à Lavandaria do Regime. Por Rafael Marques de Morais


O mercado financeiro do país tem sido liderado, nos últimos anos, pelo Banco Africano de Investimentos (BAI), uma instituição bancária nacional que antes atendia pelo nome de Banco Angolano de Investimentos. A estrutura societária deste banco reflecte, de certo modo, o seu sucesso e a institucionalização da transferência de capitais públicos para o enriquecimento ilícito de dirigentes.
Avaliado em US $8 biliões de dólares, o BAI apresenta actualmente uma carteira de depósitos e créditos estimados, pelo Banco Nacional de Angola, em US $10.4 biliões e US $3.2 biliões, respectivamente.
Por altura da sua criação, em 1996, a Sonangol surgia como o principal investidor, com 18.5 porcento das acções. No entanto, ao longo dos anos, a Sonangol discretamente transferiu 10 porcento das suas acções para a titularidade privada de altos dirigentes, para além dos que já mantinham participação considerável no capital do banco.
Como ilustração, abaixo se apresenta apenas a lista de beneficiários que, por altura da sua entrada no capital do banco, já desempenhavam funções públicas e que continuam a ocupar cargos oficiais. De fora ficam os indivíduos que entraram para o banco enquanto ocupavam cargos oficiais mas que actualmente se dedicam à vida privada. Uma dessas figuras é o general João Baptista de Matos (2,5 porcento), então chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas.
No total, dirigentes e antigos colegas, devidamente identificados, têm uma quota solidária de 47.75 porcento do BAI, enquanto 42.25 estão distribuídos entre empresas privadas angolanas, também ligadas a figuras do poder, gestores nacionais e estrangeiros do banco, bem como empresas estrangeiras, como a construtora portuguesa Mota. A Sonangol conserva 8.50 por cento das acções, enquanto a empresa estatal de exploração de diamantes, a Endiama, tem uma percentagem de 1.50 porcento das acções do BAI.
Em 2010, o Senado dos Estados Unidos da América (EUA) investigou as operações do Banco Africano de Investimentos (BAI) neste país, por suspeitas de ser um veículo de branqueamento de capitais para altas figuras do regime angolano. Da investigação resultaram algumas revelações públicas sobre a forma de distribuição de percentagens efectuadas pelo BAI a certas figuras nacionais.
Segundo o relatório do Senado, o BAI solicitou ao banco HSBC confidencialidade sobre a identidade dos proprietários da Dabas Management, José Castro Paiva, e da ABL, Manuel Vicente, para permitir “alguma privacidade em relação a este investimento.” Na realidade, o que se pretendia era o encobrimento de um crime de peculato. Como gestores da Sonangol, Manuel Vicente e José Paiva usaram os seus cargos para transferir, um total inicial de 10 por cento de um investimento público, para os seus nomes próprios.
Sobre a Arcinella Assets e a Sforza Properties, registadas respectivamente nas Bahamas e Ilhas Virgens Britânicas, o BAI tem prestado várias informações contraditórias, segundo o relatório do Senado. Como forma, de evitar a revelação da verdadeira identidade dos beneficiários, de acordo com o referido documento, em Janeiro de 2007, o BAI declarou que os 13.50 porcento das acções detidas solidariamente pelas duas empresas haviam sido colocados sob custódia de José Carlos Paiva, como presidente do BAI. Mais informou que, de acordo com a sua estratégia e da Sonangol, o principal investidor, as acções seriam transferidas “gradualmente para indivíduos privados, à medida em que possam gerar riqueza e comprar acções.” Esses indivíduos, de nacionalidade angolana, não mais receberiam do que um porcento cada do conjunto das referidas acções, conforme nota do BAI.
Por sua vez, a Sakus – Empreendimentos e Participações S.A que detém 3.6 porcento do capital do banco, tem, como testa-de-ferro, o enteado de Manuel Vicente, Mirco de Jesus Martins, seu principal representante em muitos dos seus negócios. Inicialmente, a empresa foi criada por Norberto Marcolino, alto funcionário da Sonangol, em 2005, e passou a sociedade anónima em 2007.
Uma das justificações que o banco tem apresentado junto de instâncias internacionais, para as operações de transferência de capital público para enriquecimento de dirigentes políticos, é interessante. Como principal argumento, afirma-se que o BAI foi criado como um mecanismo para facilitaro estabelecimento de uma burguesia nacional, capaz de controlar e desenvolver o sector financeiro angolano.
Como referência de legitimação, os representantes do BAI têm usado o programa sul-africano de fortalecimento económico dos negros (Black Economic Empowerment). Este programa foi lançado em 1994 pelo governo do ANC, como medida legal destinada a corrigir as iniquidades do sistema do Apartheid. O mesmo confere oportunidades económicas a grupos anteriormente excluídos, como os negros, mestiços, indianos e alguns chineses. Para além da participação económica em negócios e na gestão empresarial, a iniciativa inclui outras medidas destinadas a garantir a participação ampla integração económica e social no país.
Num dos documentos recentes, a que o autor teve acesso, os representantes do banco usam a guerra como o factor impeditivo de uma política estruturada por parte do governo. Por isso, “o BAI tomou a iniciativa de implementar medidas de empoderamento económico, mesmo com a ausência de um programa nacional e leis afins.”
Há um elemento importante que diferencia os processos sul-africano do angolano. Desde a independência, o poder político e económico tem-se mantido concentrado num grupo restrito de dirigentes do MPLA e do Estado. O que mudou foi apenas o controlo, em nome do Estado, da economia tendo passado para operadores privados, que são os mesmos dirigentes e suas famílias.
Por exemplo, em Dezembro de 2010, após a publicação do relatório do Senado, a Soares da Costa vendeu os três porcento que detinha no banco a duas empresas angolanas, por US $27.7 milhões, mas manteve a identidade dos compradores como “segredo de Estado”. Estes também devem ser figuras do poder pois, doutro modo, não haveria razão para tanto secretismo num negócio normal.
O programa do BAI, se assim se pode chamar, é um acto claro de branqueamento de capitais desviados do Estado para benefício privado de dirigentes do MPLA e do Estado que, por sua vez, incorrem em crimes de corrupção, pelo saque das riquezas nacionais. A Lei do Combate ao Branqueamento de Capitais e do Financiamento ao Terrorismo, estabelece como actos de branqueamento de capital, entre outros, a comparticipação e a facilitação de actos de tráfico de influência e corrupção (Art. 51, 1). A lei também é específica também sobre a conversão e transferência de vantagens obtidas directamente ou por via de terceiros (Ibid., 2), como é o caso das percentagens adquiridas ilegalmente, pelos dirigentes angolanos, à Sonangol.
De certo modo, o crescimento do banco tem a ver com a promiscuidade no relacionamento que mantém com o Estado, o accionista maioritário e principal devedor da instituição. É pelo BAI que passam grande parte das operações financeiras da Sonangol, entre outras. Em Março passado, a Sonangol designou o BAI como seu agente principal para a obtenção de um empréstimo equivalente a US $600 milhões, junto da banca nacional.
Em 2007, o BAI liderou o primeiro sindicato de bancos que concedeu um empréstimo ao governo, estimado em mais de um bilião de dólares. Em 2008, os créditos do BAI ao governo, publicamente divulgados, cifraram-se em US $400 milhões, enquanto a Sonangol recebeu um empréstimo de US $150 milhões. No ano seguinte, o crédito ao governo atingiu o montante de US $375 milhões.
Respeitabilidade Internacional
Apesar da sua natureza profundamente corrupta, o BAI tem respeitabilidade internacional, tendo criado, com instituições europeias, o Fundo de Investimento Privado de Angola. O BAI tem como sócios o Banco Europeu de Investimentos, criado pela União Europeia, o Fundo Norueguês para os Países em Desenvolvimento (Norfund), o Fundo Dinamarquês para o Investimento Internacional (IFU), o Ministério dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação do Reino de Espanha, assim como o Banco Atlântico. Por sua vez, o fundo é administrado pela Sociedade Gestora de Capital de Risco Angola Capital Partners, que é detida em 50 por cento, cada, pelo Norfund e BAI.
Por norma, o regime encontra grande cumplicidade junto da União Europeia e dos países nórdicos, que se abstêm de abordar, de forma crítica e pública, a situação da corrupção, da falta de democracia e da violação dos direitos humanos em Angola.
Os cidadãos devem saber sobre que tipo de detergentes os dirigentes usam, no BAI e noutros bancos similares, para a lavagem de tanto dinheiro roubado ao povo angolano. Como poderão os cidadãos,investidos de soberania, reclamar a devolução do património que é de todos os angolanos e pedir justiça? Eis a questão.
http://makaangola.org/2012/06/bai-a-lavandaria-do-regime/

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