terça-feira, 12 de maio de 2009

Mensagem aos jovens do Escritor Óscar Ribas


Caros jovens:
Como não me conheceis, vou fazer-vos a minha apresentação. Nasci em Angola.
Dado às letras, especialmente me dedicando à etnografia. Mas também produzindo obras de ficção e de poesia. Embora agindo nas trevas, não físicas, mas sensoriais, toda esta produção foi elaborada desde os 18 anos até à actual etapa da proximidade dos 88.

Para um juízo mais exacto de quem vos está falando, complementarmente acrescentarei que meu pai era português, e minha mãe, angolana, Estou radicado em Portugal desde meados de Junho de 1983, vivendo num lar da 3.ª idade, onde continuo, com a ajuda de um secretário, a ultimar a minha obra.
Já tenho dialogado com grupos de jovens e de crianças. Desta vez, talvez pela palavra inarticulada, saberei corresponder à vossa expectativa? Em vosso espírito desejoso de novidades, de algo que satisfaça a vossa curiosidade do ineditismo, tentarei penetrar nele, valendo-me de minha longa experiência.

Quem não sonha? Só o que já se foi. Pois, tal como vós, igualmente me embrenhei em ilusões, igualmente arquitectei deliciosos sonhos. Embora na última estação da vida, o sonho não deixa de me alentar, amenizar as agruras.

Desabaram os castelos urdidos na esperança? Ficámos decepcionados? Perdemos o anseio? Mas não dispomos nós de mágicas ferramentas? Recuperemos a energia, imponhamo-nos a resistência e metamos mãos à obra, Sem a necessidade, a carência do desejável, não há reacção. E sem reacção, não logramos o objectivo. De onde resultou o Progresso, senão dessa cruciante busca? Avante, pois!

Estais na época do prazer, das estúrdias. Folgai, aproveitei o ensejo. Mas não descureis da ferramenta da sabedoria. Apetrechai-vos convenientemente, sempre e sempre a melhorando. Com ela, vos imporeis social e profissionalmente. Então, que satisfação para o próprio e para os seus!

Vivemos num ambiente de sedutoras tentações. Se umas são benéficas, outras, pelo contrário, desesperam-nos com os seus tentáculos. Mesmo com os olhos abertos, precipitamo-nos num abismo. No estonteamento da queda, cometem-se desvarios de toda a ordem. Refiro-me ao horrível consumo dos estupefacientes. E quantos, na impotência da salvação, se lançam no abismo de que nunca mais se retiram? Não vos restrinjais apenas aos olhos físicos. Recorrei também aos da alma, Esses, mais penetrantes, alertam-nos melhor. Sede prudentes, jovens!

Estamos vivos? Mantenhamos a vida. Por quê e para quê atentar contra ela, sabendo que determinado rumo nos conduz a uma fatalidade? assim alegres, assim bem dispostos, fruindo a existência na luminosidade da esperança, não obteremos a paz espiritual? Errámos? Corrijamo-nos, Caímos? Levantemo-nos. Todo o tempo presta-se à recuperação.
Por ora, sois jovens, estais na fase em que o ímane do amor vos perturba. Aquela moça não vos sai do pensamento. Possa ou não ser o par que satisfaça a vossa aspiração, a mulher, que também é vossa mãe, vossa irmã, vossa consorte, vossa filha, inspira-nos o maior respeito, o maior afecto.

A par destes vínculos, ela é também a sábia conselheira, a perspicaz orientadora. Portanto, deve ser defendida pelo homem digno desse nome. O atentado contra a sua honra, em certos países é punido com a máxima severidade. Se gostamos que nos respeitem, por quê não respeitá-la? jovens, cultivai o sentimento da dignidade, da nobreza de carácter. Nunca vos alvitreis ou permitais que se ultraje ou abuse da fraqueza da mulher.

A violação, qual nódoa corrosiva, deve mortificar, ressurgir em lembranças doridas. Conforme semeamos, assim colhemos.
Sede perseverantes, uma vez que o intento não seja repulsivo. Graças à perseverança, realizei o meu ideal. Sem o querer, não advém o poder.
Verdadeiramente, comecei a editar a minha obra sem dinheiro disponível, hipotecando a uma instituição a reduzida pensão que meu pai me legou. Completei a quantia com dinheiro emprestado por um irmão. E sempre com empréstimos pagáveis com letras a 90 dias. Até que prescindi desse enervante compromisso. Actualmente, já foram editados 16 livros, restando 4 por publicar.

Na tortuosa caminhada da vida, cruzamo-nos com pessoas que, pela sua leal conduta, nos originam amistoso relacionamento, e com outras que, mal-intencionadas, nos atraiçoam, fomentando calúnias. Pior que a fera, é o próprio homem. A fera investe em necessidade de alimento ou de defesa por agressão. Por uma hipócrita amizade, já fui vítima. Portanto, acautelai-vos com as confidências.

Sempre fostes, sois e sereis os construtores de uma nação, os porta-testemunho dos antecessores, No cumprimento das tarefas e missões que vos esperam. Sede venturosos, jovens de todo o mundo!
Vou terminar esta mensagem, à maneira dos narradores dos contos populares de minha terra: - já expus a minha historiazinha. Se é bonita, se é feia, vocês é que sabem.

Fisgas de Alcoitão, 14 de Junho de 1997
Foto: http://www.cpires.com/fotos_do_lobito.html




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