sábado, 26 de setembro de 2009

António de Oliveira Salazar. O encoberto


Fernando Correia da Silva

Alguns sobrevivem ao terceiro safanão, mas nada mais podemos fazer por eles, almas penadas já são em vida. Com ou sem julgamento são despejados em masmorras. Em 1936 inauguro as colónias penais do Tarrafal e de Peniche. É no Tarrafal que vai morrer Bento Gonçalves, secretário do Partido Comunista. Outros seguem-lhe o exemplo; no Tarrafal e em Peniche, no Aljube e em Caxias.

Não, não é preciso usar da violência, somos um povo de brandos costumes. Aqui, para governar, um safanão a tempo é quanto basta.


O ENCOBERTO
Salazar, Salazar, Salazar! gritos nacionalistas. Entretanto, o que está a acontecer no resto do mundo? Consulta a Tábua Cronológica.

1936: agitação vermelha vaza de Espanha para Portugal. Reagimos: barreira militar, Legião Portuguesa, cruz de Aviz, invocação de Aljubarrota! Mando que os meus legionários vistam camisas verdes, assim não se confundem nem com a milícia do Rolão Preto, nem com a Falange do Franco. São convocados os funcionários do Estado e todos aderem à Legião; os incapazes de exercícios militares, juram fidelidade ao regime.

No mesmo ano crio a Mocidade Portuguesa, também camisas verdes. Ali os rapazes aprendem a amar e a defender a Pátria, bravos lusitos. E nas escolas imponho um livro único, passaporte para Deus, Pátria e Família.

Nacionalistas, legionários e lusitos, de braços estendidos em saudação romana, andam sempre a marchar pelas ruas, congregam multidões, fazem grande alarido:

- Quem vive?
- Portugal, Portugal, Portugal!
- Quem manda?
- Salazar, Salazar, Salazar!

Contudo, para além da algazarra à superfície, detecto o profundo silêncio da Nação. Somos tristes, eu o disse, mas há aqui um excesso de tristeza. E isto é perigoso, a caldeira do silêncio também pode explodir. Há que montar uma válvula de escape.

Chamo ao meu gabinete os homens da Censura. Digo-lhes que aliviem o rigor sobre as revistas do Parque Mayer, que alarguem o espartilho e deixem passar as alusões à minha pessoa, desde que não sejam ofensivas. E o público sacode-se a rir com os números do António da Calçada ou do Santo Antoninho da Estrela. Só mando cortar O Botas. É alcunha de mau gosto. Não se pode brincar com um defeito físico que me obriga a usar botas ortopédicas, daquelas de elástico, para disfarçar.

Também chamo ao meu gabinete o Agostinho Lourenço. Digo-lhe o que direi mais tarde ao Silva Pais:
- É conveniente que os descontentes tenham sítios onde possam desabafar sem perturbar mais ninguém. Os Cafés podem servir para isso.

Quanto mais estrondosas são as gargalhadas no Parque Mayer e quanto mais se conspira nos Cafés, mais avassala a minha ausência, omnipresença.

UNGIDO?

Por três vezes o Maligno tenta abater-me.

Primeira: em Janeiro de 1934 os comunistas convocam greve geral e tentam implantar um soviete na Marinha Grande. São cercados e vencidos.

Segunda: em Setembro de 1936 marinheiros comunistas rebelam-se. Mando que a artilharia da costa os bombardeie e afunde.

Terceira: em Julho de 1937, quando me dirijo para a missa, sofro um atentado à bomba mas escapo ileso. Bem sei que foram os anarco-sindicalistas. Mas eles já são tão poucos, que não vale a pena mencioná-los. Acuso os comunistas. Daqui para a frente, quem me atacar passa a ser comunista, eles é que são o inimigo principal.

Consequências do atentado são a comoção nacional, as mensagens de solidariedade, os cortejos, as manifestações, as missas Te Deum. Uma única vez surjo em público, a agradecer. Não me apetece, sou avesso a estas coisas, mas lá declaro à multidão:
- Somos indestrutíveis! Porque a Providência assim o destina e na Terra vós o quereis.

Ungido de Deus? Não sei, talvez... Sei apenas que, quatro séculos antes de nascer, eu já fora colocado lado a lado com o Infante de Sagres, predestinação...

AS GUERRAS DOS OUTROS

Nacionalistas espanhóis começam a gritar os nomes de Primo de Rivera, Sanjurjo e Franco e rebelam-se contra o Governo dos vermelhos. Assumo também a pasta dos Negócios Estrangeiros. Temo que, se vencerem os rebeldes, queiram mais tarde anexar Portugal como província espanhola, ambição que herdaram dos Filipes. É perigo menor e longínquo. Mas se venceram os vermelhos, o bolchevismo alastrará de imediato a Portugal, quer por intervenção militar, quer por contágio. Perigo maior, de vida ou de morte, é pois a vitória dos vermelhos. Há que ajudar a derrotá-los. E ajudamos:

http://www.vidaslusofonas.pt/salazar.htm
Imagem: http://4.bp.blogspot.com/

1 comentário:

  1. ANTÓNIO OLIVEIRA SALAZAR, MAIS CONHECIDO PELO ANTÓNIO DA CALÇADA, O ÚLTIMO DITADOR NA EUROPA - DEPOIS DE HITLER, MUSSOLIN E FRANCO.

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