terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Contra o roubo do Millennium


Os trabalhadores do Millennium BCP não têm de aceitar o roubo de salários e direitos que a administração do banco acordou com as organizações da UGT, alertou anteontem o Sintaf/CGTP-IN, contestando vivamente um «ajuste salarial temporário» que, afinal, não evita a liquidação de mais de um milhar de postos de trabalho.
Bancos salvos com dinheiro público devem ser nacionalizados


http://www.avante.pt/pt/2094/emfoco/128657/

O Sindicato dos Trabalhadores da Actividade Financeira rejeita o acordo que a Febase/UGT firmou, no último dia de 2013, com a administração do Millennium BCP, e vai promover a oposição individual e colectiva à aplicação das graves medidas nele inscritas.
Num comunicado que está a distribuir desde anteontem, o Sintaf alerta os trabalhadores do banco para o facto de que podem recusar tais medidas e impedir que lhes sejam aplicadas, mesmo que venham a ser introduzidas nas convenções colectivas assinadas pelas organizações da UGT. Para tal, cada trabalhador deverá declarar à administração, por escrito, que se opõe à aplicação dessas normas, nos termos legais (Código do Trabalho, artigo 104, n.º 2), no prazo máximo de 21 dias, «a contar do início da execução do contrato ou da divulgação do regulamento».
O Sintaf adianta já que vai disponibilizar a minuta de um texto, com esse objectivo, que os trabalhadores poderão subscrever e enviar.
Mas é destacada a importância da organização e mobilização dos bancários do BCP. Com o objectivo de «esclarecer, organizar e dinamizar a resistência contra este atentado aos salários e direitos dos trabalhadores», o Sintaf anunciou, para os próximos dias, reuniões de trabalhadores e reformados do Millennium BCP:
– dia 22, quarta-feira, em Lisboa, às 18 horas, na sede da CGTP-IN (Rua Vítor Cordon, 1);
– dia 23, quinta-feira, no Porto, às 18 horas, na Casa Sindical da USP/CGTP-IN (Rua Padre António Vieira, 195);
– dia 28, terça-feira, em Lisboa, às 18 horas, na sede do Sintaf (Av. Almirante Reis, 74G, 7.º).
Acordo para perder
O «memorando de entendimento» subscrito a 31 de Dezembro foi divulgado como a troca de postos de trabalho por cortes salariais. A redução de pessoal e dos respectivos custos é um compromisso que o BCP assumiu com a direcção-geral de Concorrência (DGComp) da União Europeia e com o Estado português, quando foi aprovada a injecção pública de três mil milhões de euros para a recapitalização do banco. Em Setembro, o banco anunciara que iria reduzir 1244 trabalhadores (dos 8744 que tinha, em Junho, para 7500 que pretende ter em 2017) e encerrar 97 balcões, para obter neste quadriénio uma «redução de custos com o pessoal superior a 30 por cento, face à média de 2008 a 2011.
A Febase destacou que o acordo permitirá «garantir a salvaguarda de cerca de 400 postos de trabalho e a reposição das actuais condições remuneratórias, após o reembolso pelo Millennium BCP do investimento realizado pelo Estado». No mesmo comunicado, a federação-base da UGT explica que «a falta de um acordo com os sindicatos colocava na mira do despedimento colectivo cerca de 1600 trabalhadores». As contas só batem certas quando se lê mais adiante, na «explicação sindical», que o banco terá que reduzir para 7100 trabalhadores, se não cumprir os cortes definidos até Dezembro de 2017.
Para o Sintaf, mesmo sem conhecer o teor oficial completo do «memorando de entendimento», mas avaliando a informação que as partes subscritoras tornaram pública, sobressaem quatro consequências:
– a redução de salários;
– a possibilidade de, futuramente, o banco proceder a despedimentos;
– o período entre 2014 e 2017 não ser considerado para contagem de diuturnidades;
– a suspensão, durante estes quatro anos, das promoções por mérito, sem prejuízo de a administração poder promover amigos e correligionários.
O sindicato da CGTP-IN assinala ainda que «este processo também está a confirmar o que afirmamos desde o seu início: colocar a questão de aceitar cortes nos salários em troca de uma declaração de que não haverá despedimentos é, afinal, aceitar os cortes e os despedimentos».
Reiterando as posições que assumiu, o Sintaf declara que:
– não aceita despedimentos ou reduções de salários ou pensões e vai apoiar os trabalhadores na luta contra tais objectivos;
– vai dinamizar todas as formas de luta (sindicais ou judiciais), que os trabalhadores do Millennium venham a desenvolver contra os despedimentos e a diminuição dos salários e pensões;
– o Millennium BCP e os bancos, em geral, salvos à custa do erário público, devem ser inseridos na esfera pública, nacionalizando-os e colocando-os ao serviço da economia nacional, e não dos interesses especulativos dos banqueiros.

A UGT faz o seu papel
O Sintaf confia que «todos os trabalhadores conscientes sabem qual é o papel das organizações da UGT: levar os trabalhadores a aceitarem, o mais pacificamente possível, a retirada de direitos pretendida pelo patronato e os seus governos, apresentando esse caminho como inevitável e considerando como vitória os ligeiros recuos (em aspectos de pormenor) que o patronato tem já equacionados aquando da elaboração das medidas que quer impor».
Num sector «onde as organizações da UGT têm o papel de direcção-geral dos banqueiros para a actividade sindical», este caso «é particularmente exemplificativo». As estruturas da UGT «identificam-se com o acordo banco/Governo/UE (DGComp) e assumem como bons os argumentos de que a “salvação” do BCP está dependente de tais medidas».
«É falso! » - protesta o Sintaf, notando que «as despesas com pessoal são diminutas e não foi por sua causa que o banco apresentou resultados negativos e imparidades que, no terceiro trimestre de 2013, atingiram em conjunto o montante de 1600 milhões de euros», enquanto os custos com pessoal foram de 511,3 milhões (aqui se incluindo as milionárias pensões de altos responsáveis, como Jardim Gonçalves).
«Mesmo que despedissem todos os trabalhadores, o BCP continuava a ter prejuízo», como comentava José Cabrita, coordenador do Sintaf, à agência Lusa, durante um protesto realizado a 26 de Novembro, junto ao edifício do Millennium na Rua Augusta, em Lisboa.
O banco, o Governo e UE pretendem «utilizar a crise de sobreprodução para a procura solvente e sobreacumulação de capital e para embaratecer a mão-de-obra, quer directamente, com a diminuição dos salários, quer indirectamente, com os despedimentos e a criação de um exército de reserva de desempregados».
O Sintaf sublinha que «é isto que a UGT aceita» e acrescenta que esta não contestou também a possibilidade de recurso ao despedimento colectivo, «cujos requisitos legais não se verificam neste caso».
Nuno Amado, presidente executivo do Millennium BCP, «congratulou-se pela transparência, empenho e razoabilidade que sempre caracterizaram estas negociações», escreve o banco, no comunicado que publicou dia 31 de Dezembro.

Accionistas só recebem
«Deviam ser os accionistas do banco a assumir integralmente a recapitalização do BCP, já que ao longo dos anos receberam milhares de milhões de euros», defendeu o PCP, numa nota emitida a 13 de Novembro, considerando que a recapitalização do Millennium BCP representou «um escândalo». O Partido lembrava, então, que «só entre 2004 e 2009 os lucros do BCP atingiram cerca de 3500 milhões de euros» e salientava que o fundo de recapitalização da banca, «não foi criado para proteger os clientes, mas sim os banqueiros». 


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