Lisboa - 1 . Está referenciada em círculos-chave do regime uma “percepção” segundo a qual o modelo presidencialista contemplado na constituição vigente desde Fev.2010 sujeitou o PR a uma sobreexposição pública que nas presentes circunstâncias, económica e socialmente adversas, faz recair sobre o mesmo um imprevisto ónus pessoal e político.
Fonte: Africa Monitor CLUB-K.NET
De acordo com análises e conjecturas em que assenta a referida “percepção”, o novo sistema foi concebido para enaltecer a figura do PR, em particular a de José Eduardo dos Santos (JES); tal desígnio entrou, porém, em “desajustamento” com uma realidade nova, a da crise, não condizente com o período de abastança que a precedeu.
Considerações mais pertinentes:
- O novo sistema presidencialista (já existente de facto; não de jure) foi calculado para beneficiar JES, nos planos político e pessoal – e por acréscimo os círculos com o mesmo conotados; a paz e a prosperidade em que o país se encontrava permitiam um esforço de reconstrução/desenvolvimento cujos efeitos benéficos reverteriam especialmente a seu favor, na nova qualidade ostensiva de chefe do executivo em que a constituição o investiu.
- A crise interna provocada pela quebra das receitas oriundas das duas únicas grandes fontes de receita, petróleo e diamantes, deu azo a uma desaceleração do crescimento e ao surgimento de dificuldades múltiplas na execução dos planos de reconstrução e desenvolvimento cujo ónus, na razão inversa dos benefícios antes estimados, recaiu em JES.
O presidencialismo que a nova constituição angolana legitimou, apresenta diferenças em relação a outros sistemas nominalmente similares. Em Angola emana e confunde-se com um “poder de base nitidamente pessoal”, corporizado por JES – uma desvantagem para o próprio em circunstâncias adversas; as instituições têm carácter formal e/ou são frágeis.
2 . A “percepção” interna menos entusiasta em relação à aplicação do novo modelo presidencialista também é devida ao conhecimento que há de múltiplos casos de desadaptação ou mesmo rejeição do mesmo face a mudanças intrínsecas que a sua adopção implicou, em termos de organização, pessoas e procedimentos (protocolo incluído).
A exposição pública considerada nefasta a que o novo modelo expôs JES é agravada pelo apagamento institucional da figura e da acção do vice-Presidente, Fernando da Piedade Dias dos Santos. Razões de saúde, mas supostamente também outras, de natureza política (AM 475), estão associadas ao fenómeno.
Por forma a minorar e/ou remediar efeitos como o desgaste da figura de JES, têm sido tomadas discretas medidas expeditas e/ou de contingência – a par de práticas como o culto da sua personalidade (AM 471), captação de novos apoios na sociedade (AM 491) ou maior controlo de focos de oposição (AM 495), em especial na imprensa.
3 . A “recuperação” do Conselho de Ministros (CM), como orgão de decisão política, é uma das referidas medidas. O novo texto define-o como orgão de consulta do PR, mas a conveniência actual de fazer esbater o papel de JES como centro de poder, fez restituir ao CM, ainda que decorativamente, a sua anterior função; as suas reuniões são agora mais publicitadas que antes.
Medidas equivalentes nos seus fins têm vindo a ser notadas noutros domínios. De acordo com uma enraizada concepção do poder, em nome da qual os erros não são admitidos, estima-se que o recurso às mesmas continuará a verificar-se até ocorrer uma reanimação da economia capaz de se projectar em proveito político e pessoal de JES.
A recente visita de Cavaco Silva a Angola foi marcada por um episódio apontado como ilustrativo das condições de desgaste a que o novo modelo presidencialista, nas actuais circunstâncias, sujeitou JES. Foi o caso de se ver constrangido a abordar em público um tema “simples” de governação (AM 490) como as dívidas do Estado às empresas.
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